By Placido De Oliveira on segunda-feira, agosto 24, 2009
Sabes, pensei em escrever-te com o coração, mas entendi que as palavras que brotassem dessa forma pura do meu interior, não serão importantes para ti, seriam ridículas e fora do teu contexto actual, seja ele qual for.
Em vez disso vou escrever-te com uma racionalidade que tenho para mim, e de ti retinha o mesmo, contrária á vida. Vou escrever-te o que não sei se algum dia lerás, uma auto apelidada conversa com minha sombra, palavras nascidas de uma razão da qual não conheço a nascente.
Terei eu perdido o amigo de outrora com o qual palavras desprovidas de razão, eram o ópio que se queimava horas a fio em lugares sem rosto?
Terei eu perdido o guerreiro com o qual travei batalhas para a compreensão do universo onde nos encontramos?
Terá sido fumado por ultima vez o cachimbo dessa paz interior, que permitia o renascer todos os dias da inspiração para uma dialéctica partilhada na busca da pureza e da verdade?
Não!
Recuso-me a admitir que tudo esteja perdido, e por isso aqui estou a travar esta ultima batalha, mesmo que num monólogo condenado a ficar no esquecimento.
Porque terás tu meu amigo que fazer parte de um “jogo” de escolhas?
Por que terás tu que ser uma estrela num céu de alguém, quanto a tua luz brilha isoladamente neste firmamento?
Será que ainda não compreendeste que nesse jogo onde te encontras, se está a perder algo inesquecível, algo maravilhoso, algo único que ainda não encontrei em qualquer outro ser humano, tu meu amigo, sim tu.
Falas do medo de amar, mas tu bem sabes que a vida é composta de tudo isso: perder, ganhar, dor, felicidade, alegria, lágrimas, beleza, paz e guerra, sempre tiveste a clarividência para me ensinar que a vida contém tudo isso, e da mesma forma me ensinaste a com isso conviver e aprender a seguir o meu caminho.
Agora vejo-te a ti a tentar iludir essa realidade que tantas vezes enfrentaste, dentro de um castelo virtual cujos muros são tão altos, que nem deixam ver a luz que tu irradias.
O amor sempre incluirá posse, mas como definir “possessão”?- meu mestre orienta-me no caminho desta definição-, sem a tua ajuda eu só posso dizer que se tu não te pertences como podes pertencer a alguém ou esse alguém a ti?
Se tu não és o dono de ti mesmo, como podes ser de alguém ? nunca estarás preparado para o amor dessa forma meu amigo.
Concluímos em tempos que a nossa ânsia por tudo no seu correcto lugar, cada assunto no seu tempo, cada palavra no seu estilo adequado, não era um prémio para uma mente ordenada, mas pelo contrario, um completo sistema de simulação por nós inventado ainda que inconscientemente, para esconder a fantástica desordem da nossa natureza.
Descobrimos que não éramos disciplinados por virtude, mas como reacção natural à nossa desordem interior, e que tentávamos quase sempre ser prudentes sempre que éramos pessimistas.
E no final, meu mestre, descobrimos que não existe pior escravidão que ser escravos de nós mesmos.
Quantas vezes me ensinaste que a maior descoberta desta vida é a do nosso verdadeiro "eu", e como criticávamos as maneiras que o mundo e as pessoas inventam para se defenderem da dor.
Inventam papeis, mascaras, palavras, faces, sempre com o mesmo objectivo, não sofrer.
Aprendem infelizmente muito cedo que o sofrimento começa quando se expõem diante dos outros como são, e que essa exposição os converte em almas vulneráveis.
Mas tu meu mestre, ensinaste-me uma grande lição, ensinaste-me que tudo isto não passa de uma grande mentira para satisfazer espíritos débeis, ensinaste-me que não existe forma de evitar a dor nesta vida.
Ensinaste-me que quando isso fazemos tornamo-nos reféns de nos próprios, e o nosso coração numa prisão, vivemos numa ilusão de segurança que definitivamente não existe, e perdemos a oportunidade de experimentar inesquecíveis emoções.
Que saudades tenho de ti meu amigo e dos teus sábios ensinamentos.
Amar e outras coisas na vida tem os seus riscos, incluindo o risco de sofrer, mas tu próprio me disseste um dia, que existem outros riscos na arte do amor, o risco de ser amado, respeitado, correspondido sem limites, desejado e tudo o mais que resultar da sublime realização de amar.
Vive a tua vida meu querido amigo e mestre, a tua!, a que sempre desejastes, e que comigo partilhas à muito tempo, ama quanto puderes, quanto sentires, e fica certo que nunca serás menos por isso, bem pelo contrario serás aquilo a que um dia designaste por: o mais bravo guerreiro do amor á face desta terra.
Volta a ser verdadeiro contigo próprio
Eu estarei sempre naqueles lugares sem rosto à espera de fumar uma vez mais contigo o ópio da verdade
Tua sincera amiga
A tua sombra
24/08/2009
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