Poesia e pensamentos livres

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Disperso momento
Não sei o que quero
Sei que me ausento
Num acto sincero

No nada que tenho
Quadro encantado
Esquecido desenho
Em papel já usado

Imagino que tenho
O que penso querer
A ânsia contenho
Querer é sofrer

Nunca o engenho
É pouco ou demais
Cansado me empenho
Não desisto jamais

Nunca me canso
De partir e chegar
No vazio me lanço
Para me encontrar

Nas estradas de mim
Caminho certeiro
Eu sei que assim
Chegarei primeiro

Ao ser escondido
Ao eu mais calado
A esse ser oprimido
Numa cela fechado

Recuo e avanço
Num mundo só meu
Canso e descanso
Dentro deste céu
Penso e esqueço
O que foi o que sou
Mas sei que mereço
Receber o que dou

Caminho sem futuro
Esqueço o passado
Escondido num muro
Choro sempre calado

Sou o que se afasta
Da sua real essência
Sou o grito de basta
De toda a inocência

Na ânsia de ser
Conhecido em mim
Continuo a viver
Esta vida assim

Rebelde cansado
De armas á porta
Empunho o machado
Da minha revolta

Quero agora gritar
Para que possam ouvir
Não quero pensar
Para poder existir

Podem-me encarcerar
Não me vão demover
Tenho asas para voar
E assim vou fazer

Voar para um mundo
Onde possa ser eu
Simples vagabundo
Na terra e no céu
11-11-2010


Hesitei! Um ou dois?Costumavam ser dois!
Cheios de tudo e de nada, mas plenos de sonhos que tocavam tão alto em mim, em ti, e na vida.
Hoje existe só um copo nesta mesa. Mas no meu corpo, mais que nunca, corre a essência de uma garrafa partilhada.
Tu não falas e ainda assim calo-me para te escutar. Pairas noutros mundos e no meu intoleravelmente escuto as tuas melodias.
Imagino-te em versos que não escrevo e canto-te em melodias que nunca terão letra.
Imagino-te!
Em todas as palavras que nunca me disseste, em todos os gestos com que nunca me tocastes, em todos os sons que nunca de ti saíram.
Imagino-te em tudo o que nunca fostes!
Vivo-te em cada centímetro de mim, pinto-te em cada pensamento, sinto-te em cada suspiro, desejo-te em cada sorriso tímido que deixo sair cada vez que bebo deste copo solitário.
Estupidamente te desejo!
Imagino algo inimaginável.
Sonho esse sonho que no limite me escraviza. Mas não interessa!
Toco os meus lábios neste copo tantas vezes partilhado, toco-me!
E na ausência de ti a que já me habituei, percorro o meu corpo na sublime descoberta de um universo que nunca soubeste explorar.
Voluntariamente me entrego, mais uma vez, a ser musa de uma inspiração ausente que nunca me escreveu.
Que me interessa!
liberto-me!
Costumavam ser dois!
Existe um!
Meio cheio de nada mas com o sabor do que de mais real existe em mim.
Deixo-me arder nesse sonho, queimo-me!
Imagino!
Simplesmente imagino!
A garrafa vai acabar vazia e eu passarei por todas as metamorfoses enquanto o liquido escorrer no meu corpo.
Mas hoje! Só hoje! O copo é teu.
Amanhã existirá uma outra qualquer garrafa.
Mas essa, será partilhada no suave toque de uma poesia escrita na minha pele por um poeta que me sinta.
11-11-2010


I – Tudo é temporário

A vida é o palco onde interpretamos um papel permitido pela vastidão da nossa ignorância. O que acreditamos ser do domínio conhecido num determinado momento, constituirá o vasto universo da dúvida no momento seguinte. A linha que divide o compreensível do incompreensível é definida por segundos que separam o passado, presente e futuro. De estação em estação tudo se renova, reveste-se de nova forma de novo sentido. As árvores que contemplamos perderão as suas folhas e no seu renascer ganharão outra forma e dimensão. Na natureza não existe duas criações iguais, e quando nos deitamos à sombra dessa árvore pensando que a conhecemos desde sempre, já esta nos observa com nova roupagem e nos abraça com novos braços. Nada existe eternamente mas coexiste temporariamente. Qualquer conclusão sobre a realidade ficará vazia de conteúdo pela sua não existência na mesma forma no momento seguinte. Na natureza o único permanente é a mudança. Um universo em movimento fruto da confluência entre o aparente e o concreto, a ideia e a materialização, o vazio e o preenchido, o existir e o não existir, o ser e o ser transformado. A nós, pura matéria também em transformação, cabe-nos a inevitável convivência com o incompreensível, aumentando a nossa consciência da sua vastidão. Essa é a nossa insignificância mas também a nossa grandeza. Aumentar a consciência do mutável, expandir o domínio do que nos é incompreensível, é o único papel que nos encaixa na perfeição. Interagir com a vida, adaptando-nos, utilizando a sua imprevisibilidade para proveito da experimentação, do usufruto da beleza do incerto, da inevitabilidade do erro ou da surpresa do acerto. Tudo no tempo que nos é concedido (embora por vezes lhe chamemos outras coisas…), não é mais que a consequência da luta de uma vontade ignorante na ambição da sabedoria efémera.

II – A incompreensão compreensível

A ignorância e o conhecimento têm uma relação directa. É sempre mais ignorante quem aumenta o perímetro da sua sabedoria. Tudo compreende quem nada viveu. Não tem dúvidas quem nada experimentou. A verdade é uma estrela temporária que sempre morrerá para dar lugar a outra e perpetuar a luz. É um universo de subjectivismo contextual, uma adaptação das circunstâncias, o eco da voz que se gera no subconsciente à medida que caminhamos na estrada do desconhecimento. Atravessamos a vida na periferia da ignorância, trespassando em cada aurora o universo do incompreensível, com a insignificância do que vivendo compreendemos no seu momento. Na verdade a incompreensão que nos domina é completamente compreensível. Desde logo porque a nossa construção foi planeada por arquitectos da “roda” num momento em que o homem já tinha pisado a lua. Começam nas escolas por nos incutir valores de uma sociedade que não existe. Formam-nos nas universidades para ciências que não existirão no futuro. Vendem-nos valores de respeito pelo igual, pelo aceitável, e não nos ensinam a disciplina da convivência com o diferente. Devíamos ser formatados como agentes da mudança mas pintam-nos com as cores da perpetuação do existente. Ensinam-nos e esquecem sempre que nos devem educar. Entramos com a vista turva, tementes do incerto para este processo em que nos formatam a uma realidade. Quando saímos somos completamente invisuais para a realidade que encontramos. Somos o produto de uma educação, que se tivesse a oportunidade, ensinaria um esquimó a viver do consumo de carne de vaca. Como seria ideal que nos levassem a desenvolver a nossa intuição, a potenciar a nossa unicidade, ela sim, capaz de ser alavanca da mudança. Como seria ideal que nos incutissem, não simplesmente a aceitação do estado das coisas, mas a por em questão tudo o que existe em função da sua efemeridade. Como seria uma sociedade que forma pessoas não para perguntar “que horas são” mas para questionar “que raio é o tempo”? Somos meros robots programados por uma ideia quando ao mesmo tempo a sociedade se transformou e exige outra.
"Dêem-nos o supérfluo da vida, e dispensaremos o necessário”, alguém o disse e não foi eu. E basta sair para a rua para estar rodeado das mais banais manifestações deste desconhecimento compreensível. Ideais “pret-a-porter”, procura do normalizado, ambição do superficial. A luta sangrenta pelo “ter” pelo “ser” mesmo que à custa da total aniquilação do “sentir”. A veneração do efémero em ignorante detrimento do eterno.
Quero continuar a acreditar, que esta realidade é consequência de uma ilusão imposta, vendida ou ensinada. E que todos os seus actores regressão a casa depois da sua brilhante interpretação desejando uma realidade diferente, ou simplesmente – acrescentaria eu -, uma realidade. Manipulando com liberdade a frase “Dêem-nos o supérfluo da vida, e dispensaremos o necessário” eu diria “ Formem-nos com a consciência do necessário e dispensaremos o supérfluo”.

III – A inversão da pirâmide

Mas como tentar dominar a constante mutação do real, e dessa forma aumentar o perímetro da fantástica ignorância? Como? Não sei! Vivo com isso apesar disso e por isso. Tomei consciência e aceitei que nada do que somos seremos! E nada do que fomos continuamos a ser. Somos hoje consequência do ontem vivido, seremos amanhã o reflexo do hoje construído. Um misto de realismo e alquimia, de sonho e realização, de romantismo e pragmatismo, de luta e submissão, de rebeldia e conformismo, de certeza e experimentação, de displicência e reflexão, de dúvida e compreensão. Somos e seremos! Do tudo que é nosso um pouco, do muito que é de outrem outro tanto.
A minha única convicção é saber que jamais saberei, que todas as minhas dúvidas se perpetuarão mesmo que num determinado momento me pareça o contrário. Compreendo a minha passageira condição neste mundo, e somente me dedico ao deleite da surpresa com todos os seus mistérios. Deixei de tentar compreender o incompreensível e simplesmente sinto. Não desejo um futuro de saudades do não vivido, enquanto tento compreender as razões de o não ter feito. Não desejo porque não tendo uma métrica para a saudade desvalorizaria o seu tamanho, qualquer que ele fosse. Alimento cada dia a capacidade de sentir o encanto da imprevisibilidade de um palco em transformação. Vivo esfomeado pelo sentir e aceito as consequências dessa fome. Nesta vida muito ganhei e outro tanto perdi, em proporção igual ou diferente que interessa! Perder e ganhar será sempre uma consequência! Sejamos parte activa ou meros espectadores. No primeiro caso perderemos por arriscar ganhar, no segundo por nada ter a perder. Sempre perderá mais, quem aumenta dúvida à ignorância pela vivência da realidade. A ignorância não é mensurável “ad-eternum “, diminui para quem só existe, aumenta inevitavelmente, para quem arrisca viver. A dúvida é compreensível e justificável. Muito existe na vida que não necessita de qualquer explicação, simplesmente é assim. Somos mentes temporárias que exploram um universo eterno. Uma luta tão desigual quanto fantástica. É exactamente na nossa temporalidade que reside a nossa beleza. O que é eterno nada valoriza, porque é isso mesmo, eterno! Para os mortais tudo embora temporário, pode durar uma eternidade numa consciência com lembranças. É na experimentação activa da constante transformação, que ficamos com esses quadros estáticos que imortalizaram um momento, aos quais chamamos de memórias.
Memórias!
Sorrisos que damos à vida quando esta não sorri para nós.
Memórias!
A nossa vitória sobre o tempo, a bandeira de eternidade na colina do efémero. Tudo o que fica quando tudo resto passa. Por elas vivemos por elas experimentamos, lutamos, sonhamos e erramos.
Memórias! A vitória da ignorância humilde sobre a mutação.
E se hoje for um desses dias em alguém acha que tudo acabou, que o tempo já enferrujou o que antes era um sorriso fácil, saia para rua! A vida fala, sussurra, anuncia e realiza. Tantas vezes este processo é alheio à nossa realidade, não porque não exista! Porque existe e sempre existirá! Mas porque na ânsia dos dias ou das horas não observamos os segundos. Na surdez imposta pelos barulhos dos nossos medos, perdemos a capacidade de escutar a sua voz.
Saia para a rua! Perca-se, seja ignorante e escute os sons da natureza. Valorize as horas alimente-se dos segundos. Alguém disse, ”temos direito na vida a um erro grave, a um vício inofensivo e a um amor verdadeiro”…. Seja os três, “Contemple os dias passados mas tenha os olhos voltados para a eternidade”. Decida aceitar que devemos viver pelo que nos mata e morrer pelo que nos faz estar vivos.
Não! Não sou um lunático que ou entrou no limiar do desespero, nem me rendi aquelas substâncias que o organismo não expele de forma natural. Não tive mais remédio que aceitar a inversão da pirâmide dos valores da minha existência. O que nos mata é exactamente o mesmo que nos dá vida. O tempo! A vida é em si mesma um hábito que mata. E é na forma como com ele lidamos que reside um dos segredos da felicidade abraçada ao incompreensível. Vivamos sem pensar nele, mas com ele e para ele. Sejam quais forem as circunstancias sempre teremos o poder de mudar o nosso tempo e a forma como as estações se vão apresentado aos olhos da nossa insignificância. Nada fica sempre igual e nada existe realmente. Aparência e vazio existem simultaneamente. Viver é a única maneira que conheço para poder sonhar. E sonhar a única forma que conheço de me sentir vivo.
Que seja eterno tudo o que de temporal em mim existe.
Que eu atinja a eternidade por tudo aquilo que em mim não é visível.
Enquanto vivos tudo é despedida e por isso agora me despeço com todos os sonhos do mundo que faço meus, e com este sorriso que é vosso.
Que me faz sair agora? Neste dia de sol onde agarro a vida com a força dos sonhos.
Que me faz sair agora? Nesta noite, onde a ultima lágrima secou pelo calor de todos os meus sorrisos?
Que me faz sair agora?
A certeza de que só lá fora morrerei experimentando a vida, e só com esta poderei alterar o rumo do efémero vencendo o que me mata.

11-05-2010


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