Poesia e pensamentos livres



Agradeço este teu último e digno acto.
Agradeço!
Mesmo sabendo que dele esperas o que desconheces que não desejas e o que bem sabes que não te darei.
Agradeço!
Mesmo sabendo que ignoras que amar não é uma flor cuja beleza desabrocha para a vida, mas sim a raiz de uma árvore que se fixa na terra e que se alimenta do sol de “ontem” para crescer esplendorosa num contínuo “amanhã” iluminado.
Todo o resto é como esta flor, como nós!
Beleza momentânea perfumada por todas as ilusões, com a chama da vida a esfumar-se lentamente.
Esta flor cumpriu o seu propósito. Não o teu! Mas o dela e o meu.
Bem perto de mim leva-me numa viagem para bem longe.
Desperta em mim a necessidade de sentir a beleza de quem sou e da vida que mereço.
Sem ruídos, vozes exigentes ou expectantes.
Sem abraços de ansiedade mendiga.
Sem sonhos alheios, sem visões impostas.
Simplesmente perfume sem ruído de vida em pensamentos dispersos como que tentando ver nela o que em alguém tanto desejei ver, o que para mim tanto desejei ter.
O mundo que me toca não é um jardim, mas a minha pele merece experimentar o acetinado toque das flores que em mim desabrocham.
Quis ser parte e fui mera vertigem numa loucura cheia de nada.
Vagueei em sombras onde me senti despejada de mim em dias coloridos de mentiras.
Só o que não se vê de mim viveu o verso certo.
Sei que em algum infinito me espera a simplicidade de uma solidão partilhada onde a verdade dê todos os sentidos à vida.
Sei que em algum infinito perderei a minha razão ao querer permanecer parte de algo.
Mas agora desfruto desta momentânea fragrância de voltar a ser simplesmente mulher. Agora silencio todas as vozes de solidões alheias, para escutar os sons da solidão que me pertence.
Agora vou para onde a minha presença caminhe por onde eu caminho e a minha alma viva onde eu vivo.
Para longe de ti mas perto de mim.

12-01-2011




Olho, olho-te!
Sinto que o tempo parou!
Sais em silêncio. Ironia! Surpreendeste-me!
O que sempre me incomodou em ti foram os teus barulhos. Fica o caminho sinuoso que nos trouxe até aqui.
Tudo o demais reflexos de um rosto que deposita as desilusões aos infinitos pés da verdade.
A vida despede-se de um momento para saudar outro.
Cansaço!
Mais uma vez o dramatismo do fim de linha e o peso de todos os inícios.
A minha saudade saúda-te, como que num processo automático de despedida.
Vou ficar aqui até que a tua sombra desapareça no horizonte e dessa forma tenha a tua altura.
Sairei quando me cansar de apreciar o momento em que, pela primeira vez, em silêncio conseguiste ser honesto.
Pensávamos que tínhamos todo o tempo do mundo, e de repente anoiteceu.
De te sonhar cheguei até aqui!
De te amar, por nada ter, te deixo ir!
Partirei!
Agora tenho tempo!
Irei até onde o meu corpo toque, em infinitos já me perdi o suficiente.
Hoje é dia de festa!
Todos os meus fantasmas voltam a vestir o fato da celebração e divertem-se debaixo das árvores despidas de folhas que sucumbiram ao Outono da tua genuína indiferença.
Não entro no exaspero das lágrimas!
É dia de festa, alegro-me!
Alegro-me porque o meu fracasso em ti constrói-me, o teu em mim, é mera consequência de quem és

02-12-2010


Hesitei! Um ou dois?Costumavam ser dois!
Cheios de tudo e de nada, mas plenos de sonhos que tocavam tão alto em mim, em ti, e na vida.
Hoje existe só um copo nesta mesa. Mas no meu corpo, mais que nunca, corre a essência de uma garrafa partilhada.
Tu não falas e ainda assim calo-me para te escutar. Pairas noutros mundos e no meu intoleravelmente escuto as tuas melodias.
Imagino-te em versos que não escrevo e canto-te em melodias que nunca terão letra.
Imagino-te!
Em todas as palavras que nunca me disseste, em todos os gestos com que nunca me tocastes, em todos os sons que nunca de ti saíram.
Imagino-te em tudo o que nunca fostes!
Vivo-te em cada centímetro de mim, pinto-te em cada pensamento, sinto-te em cada suspiro, desejo-te em cada sorriso tímido que deixo sair cada vez que bebo deste copo solitário.
Estupidamente te desejo!
Imagino algo inimaginável.
Sonho esse sonho que no limite me escraviza. Mas não interessa!
Toco os meus lábios neste copo tantas vezes partilhado, toco-me!
E na ausência de ti a que já me habituei, percorro o meu corpo na sublime descoberta de um universo que nunca soubeste explorar.
Voluntariamente me entrego, mais uma vez, a ser musa de uma inspiração ausente que nunca me escreveu.
Que me interessa!
liberto-me!
Costumavam ser dois!
Existe um!
Meio cheio de nada mas com o sabor do que de mais real existe em mim.
Deixo-me arder nesse sonho, queimo-me!
Imagino!
Simplesmente imagino!
A garrafa vai acabar vazia e eu passarei por todas as metamorfoses enquanto o liquido escorrer no meu corpo.
Mas hoje! Só hoje! O copo é teu.
Amanhã existirá uma outra qualquer garrafa.
Mas essa, será partilhada no suave toque de uma poesia escrita na minha pele por um poeta que me sinta.
11-11-2010



Desejo as luzes, estou pronta!
Tenho no corpo a ânsia da inconsequência e na alma a febre do momentâneo.
Quero dizer que não, que sim, talvez, ou simplesmente calar-me no incógnito da música.
Esqueço tudo!
Por momentos quero deambular por desejos de mim na despreocupação de um sonho acordado.
Que se lixem os pudores, sinto asas nos pés e quero voar nesse espaço onde tudo é permitido e a nada se dá nome.
Apetece-me adormecer numa qualquer música, sem pensar no corpo que me toca ou na mente que me abraça.
Quero sentir-me viva, e regressar sobre a luz de uma madrugada silenciosa, cheia de mim e mais particular que nunca.
11-11-2010


A noite está perfeita.
Silêncio! A lei é minha o palco é meu.
Quanta magia sinto neste momento em que volto ao tempo em que as esperanças voavam de pijama. O pijama já não é o mesmo, mas é meu! Voo na mesma.
Ah! Chuva Purificadora.
Podes molhar sem piedade e gelar sem clemência.
Não estou Aqui!
Voltei ao lugar das dores dissipadas, ao recanto do esquecimento onde a solidão se expõe em todos os silêncios genuínos.
Aos poucos todos os mortos em mim, regressam pela estrada da memória.
E os que nunca partiram, cantam melodias de aleluia pela libertação de tudo o que deixei de ser enquanto fui tua.
Vou estar aqui até ao momento em que a minha pele me obrigue a outra realidade.
E sim!
É Inevitável!
Um dia perderei outra vez a lucidez e voltarei a amar.

11-11-2010




Hoje é um desses dias em que saio de mim para ser tudo no teu desejo.
Estarás tu à espera?
Estarás preparado para mim?
Fantasia!
Acordei a pensar na magia da surpresa, no desejo provocado.
Aqui estou!
Que esperas?
Se soubesses quanto amor e desejo cabe nesta roupa que me veste.
Dou-me!
Toma-me, assalta-me e descobre-me em viagem por mim numa rota de cama desfeita.

10-11-2010



Cada dia me dispo das vestes gastas de mim.
Esqueço o que fui para lembrar-me de quem sou.
Nada me chega completo porque nada procuro.
Experimento tudo vestido desse nada que carrego.
Sou realidade entre o momentâneo e o eterno.
Memória de encontros fortuitos coloridos de eternidade pelo pincel do acaso.
Transfiguro-me todos os dias com rituais tipificados na irrealidade confusa das coisas, num equilíbrio desequilibrado, na ânsia de mim no universo dos erros que cometo.
Mas sei que em mim tudo tem que ser assim.
Consequência de solidão imperfeita que arrisca na perfeita espontaneidade.
Nada será meu que eu não sinta e nada terei que não me construa.
O que disso poderia ficar é um nada de um erro clandestino.
Memórias! Só as que não matam o presente por comparação.
Memórias! Só as que não matam o presente na ânsia de futuro.
Nunca me perdoaria a angústia de pensar em corrigir erros.
Cometo outros.
As possibilidades são infinitas.
Sou maravilhosamente imperfeito e estupidamente momentâneo.
Tenho corpo para sentir o vento e uma alma para admirá-lo.
E só quero continuar a deslumbrar-me fora de mim, sem palavras inúteis, com todos os silêncios de um sorriso de admiração.
E no meio da confusão das coisas, que já não questiono, quem sabe tocar uma outra imperfeição que me complete.
Estou vivo e tudo é consequência.
E só assim me pertenço por destino meu.
Nada mais me interessa!
O meu dia chegará!
Sempre chega!
Por esse lado certo de todo o errado que existe em nós,
A vida.
06-11-2010






Sou tua!
Mas tu não sabes como te sinto.
Nem poderás saber, perdido que estás em ti e nos sonhos nos quais não me colocas.
Deixo o desejo de que um dia descubras por mero acaso quem sou, não em mim, mas em ti.
Nesse dia não penses!
Abraça-me!
O teu único erro serei eu.
E tudo o resto - acredita -, não vais necessitar.

02/11/2010





Vontades e realidades em linhas paralelas que momentaneamente se intersectam.
Ou quiçá nunca!
Tudo acontece entre tempo e tempo, entre pressa e pressa.
Gente à procura de ter pressa.
Gente com pressa da procura.
Gente calmamente com pressa, ou apressadamente calma.
Do finito ao infinito à velocidade da luz.
Quantificações simplistas de uma realidade equacionável.
Num espaço indefinido entre tudo e nada ou qualquer coisa.
Tudo está errado ou provavelmente tudo pode estar certo.

Desequilíbrios matemáticos em equações desiguais.
Demasiadas incógnitas!
Tudo existe ou inexiste e no meio disso nós.
Meio existência, um quarto de vivência e tudo o resto sonho.
Na metade de existência o todo não tem resto.
No quarto de vivência todo o meio é esquecido.
E no resto o pouco do nada que desejamos.
Quarto, meio, resto, que raio! Tanto de tão pouco faria uma equação melhor.
E tão pouco resta para não existir equação nenhuma.
E será que existe solução? tantas são as incógnitas!
Aumentar o resto elevando o quarto diminuindo o meio?
Diminuir o meio potenciando o quarto?
Resto zero, igualando quarto e meio?
E outro tanto de tantas outras.
Múltiplas combinações e nem sequer gosto de matemática.
Complicações aritméticas de uma realidade sempre a mudar as equações.
Habitamos nos subúrbios do resto alimentando-nos das memórias do quarto para engordar o meio.
Esse conjunto de metades em linhas paralelas com a unidade, com intersecções pontuais que rapidamente divergem exponencialmente.
Como seria ideal se tudo voltasse à simplicidade do um mais um igual a dois.
Mas não!
Infelizmente somos feitos de desequilíbrios conformadamente equilibrados.
Tudo se move, enquanto se move, pela majoração romântica do resto.
E mesmo que nada reste desse resto majorado, momentaneamente saímos dos subúrbios e visitamos a cidade.
E entre visita e visita quem sabe descobrimos um quarto com janela para o horizonte da materialização do resto.
Venceremos a matemática, não tenho a menor dúvida disso!
Na nossa génese já o fizemos!
Somos o resultado de uma equação num espaço tridimensional, que nasceu graças à força de contestar probabilidades ínfimas.
Simplifiquemos os teoremas reinventando a nossa lógica.
A vida será sempre superior a todas as matemáticas.
Meio, resto, quarto!
Cada dia uma nova equação.
Cada vida uma equação diferente.
A minha equação de amanhã será igual à de hoje?
Não sei!
Que o resto me domine e traga novas igualdades.
E quem sabe as nossas vidas não terão um ponto de intersecção.
No finito ou infinito!
Incógnita!
Mais uma.

24-08-2010



Perdi-te!
Dou mil voltas na cama e acabo por entender que é inútil permanecer deitado. Estou impaciente, inquieto, e com essa sensação de quem não quer pensar e não faz outra coisa que não isso mesmo. Tenho que esperar que o sono me domine ou que os pensamentos desordenados que agora me escravizam se afastem. Não importa! Levanto-me e acendo esse cigarro que reclama misericórdia à insónia. Desgraçado! Não sabe que é estandarte de rendição incondicional ao abraço da noite.

Freud disse que o cigarro é apenas um substituto da masturbação. A dar-lhe razão, já não teria mãos para nenhuma das duas sensações. Mas se os cigarros não me ajudarem experimento ambas.
Rendido à valsa das sombras de um fumo libertador (Freud pode esperar…), pergunto: - quanto destes pensamentos que me inquietam serão efectivamente meus? Sou consequência de mim, ou serei o resultado de pensamentos de mil almas de rostos incógnitos, que em mim habitam com vida própria?
Quero deixar que uma parte de mim me abandone da mesma forma que o fumo se dirige às mais pequenas frestas em busca da liberdade. Por vezes não sei se tenho voz própria ou se os sons que de mim saem são os ecos dos lamentos de um mendigo, vivendo das esmolas de alheia profecia.
Abençoada insónia que na sua clarividência me impele para aniquilar tudo o que me separa de ser profeta do meu futuro. Tenho deixado a decisão de mim para o evoluir do tempo, cobarde adiamento que me transforma numa qualquer coisa, que reza credos a um deus menor vendendo a si próprio a imagem de possuir um lugar no Olimpo.

Abençoada insónia! Ainda sem dar razão a Freud.
Algo em mim existe sem minha permissão, corre no meu sangue sem que nada até agora tenha podido fazer – se é que fiz alguma coisa!
Uma imagem, um pensamento, um sonho, uma memória, um passado, um presente ou a conjugação dos dois numa imagem de futuro? Não sei!
No desnorte invisível da minha alma sempre volto, inconscientemente, a essa terra que foi minha mas que já não tem vestígios dos meus passos. Porque tenho que entrar onde não quero e sempre sair, isso sim, desejando não estar lá?
Porque tenho que perpetuar esse movimento? Como é possível que alguém ou alguma coisa, ausente de mim, invada todos os meus espaços?
Quando parti dessa terra sei que passei a prestar vassalagem à indiferença - É normal! - Se tanto me dói assim a ausência, é porque em cada instante nesse espaço em mim existi e estive vivo. Tanto tempo a plantar um jardim cheio de árvores perfumadas para em determinado momento ter que abandonar a sua frescura e queimar-me debaixo de um sol desconhecido. As árvores levam tempo a dar-nos sombra, e eu sei que nesse momento, perdi a vontade de voltar a ser agricultor dedicado. O tempo mata-me, ou eu mato o tempo, o efeito final será sempre o mesmo. Claro que sei que essa terra há muito que deixou de ter o meu nome inscrito. Não tem os aromas do meu perfume, vestígios da minha pele, pedaços da minha alma, desejos do meu corpo. Não relata mais a minha história nem tem sonhos de mim. Está agora bem distante de tudo o que de mim está perto. Estou longe, está longe, estamos longe, bem sei! Mas continuo a relegar para secundário o importante, e continuo na sua ausência, a determinar os limites da minha essência debaixo da sombra das árvores que lá plantei.

Abençoada insónia! Ainda sem dar razão a Freud.
Sei agora que desejo descansar das reflexões e ser doente temporário vítima do esquecimento. Se a minha face fosse o reflexo do coração, o mundo contemplaria uma estátua de pedra em local incerto. Tenho-me permitido viver na dúvida, prisioneiro do passado com alma fechada, egoísta e solitária. Sou refém de uma lembrança ou uma lembrança é refém de mim. Uma memória com alma própria, e não descubro a forma de controlar as suas asas nem como impedir o seu voo. Essa terra que habitei já não corre no meu sangue, mas os meus passos seguem reféns do intervalo entre o sonho e a memória. E nesse espaço encarcero-me, convertendo-me no meu inimigo mais íntimo.

Penso que tudo me é indiferente, mas engano-me!
Engano-me ao pensar que a humanidade dos meus olhos pode cegar pela dureza de uma aparência que não tenho capacidade de sustentar;
Engano-me na ilusão de pensar que quem não venera nenhuma bandeira poderá algum dia ser pátria de alguém;
Engano-me quando penso que o mundo é meu, mas só o será no dia em que tiver consciência de que nada me falta;
Engano-me quando deixo que a vida aconteça no oriente de uma memória, porque as duas se esfumam da mesma forma;
Engano-me quando penso que posso ser livre comprometendo a minha própria construção;
Engano-me, irremediavelmente, porque com tudo o que sou, trago nos olhos um mundo que a alma não sente.

Abençoada insónia! Ainda sem dar razão a Freud.
Sei agora mais que nunca que quero despir esse fato de pedra que me veste de todas as verdades que minto. Fazer dos meus sonhos a minha única verdade, matar o que em mim já não vive mas que levo, sem saber porquê, colado nos meus passos e preso ao meu tempo. Quero estar nu de mim para me vestir por inteiro. Arrancar-me às raízes que me prendem a uma terra já distante e voltar, ainda que por momentos, a ser pertença de mim como uma flor é da terra que lhe dá vida.

A quem pertenço? Não sei!
Que pátria é a minha? Desconheço!
Mas a mim me quero prender e que, de tão efémera que seja, pareça eterna essa libertação.
Está na hora de calar os barulhos da desordem.
Quero o meu calendário e um dicionário com as minhas rimas.
Despeço-me terra distante, digo-te adeus e cuida das flores que plantei.
Nas memórias das tuas esquinas e ruas percorridas, fui perdendo a noção de quem sou.
Mas não quero ser um “quase” que morre na ideia de um “talvez”
Nem perder o “agora” rendendo-me à ideia do “nunca”.
Nada é tão alto que o sonho não lhe toque.

Tudo termina, até esta insónia. Deixo uma caneta com a tampa toda roída e um cigarro que agoniza entre dezenas de iguais.
Não dei razão a Freud!
Fecho as luzes, vou dormir!

27-07-2010


A noite está calma, a alma serena, e o meu corpo tem a leveza do vazio.
Não olho!
Não escuto!
Não paro!
Sigo decidido no trilho da ausência.
Não quero espalhar sorrisos.
Quero a fome de calar-me.
Não quero escutar palavras que me condenem nem um único som que me venere.
Sigo o percurso da fuga do tédio ruidoso.
Quero estar onde o silêncio me sente, onde escuto o meu sentir, vazio de ninguém.
Preciso dessa sensação de insignificância que tudo relega para segundo plano.
Sento-me numa pedra que não me conta a sua história e tem tanto da minha.
As primeiras estrelas iluminam um mar que geme à minha frente.
Imagino no rodopio das ondas gritos de animais selvagens enjaulados.
Tão presos quanto eu a esse espaço entre o ter e o perder a que chamamos vida.
Cada batimento das ondas contra as pedras, recorda-me esse momento finito.
No meu recanto solitário, com os olhos longínquos, transparece em surdina um segredo.
Não será escutado! Mas o azul oceânico da eternidade o levará.
Que liberdade sinto neste isolamento.
Vou fundo nos meus desejos egoístas. Estou só! O momento é meu.
Que me importa se é fantasia, se nunca na realidade me deitei em cama equilibrada.
Se nunca as minhas ânsias navegaram por mares reais.
Neste momento sou pouco do que aprendi e quase tudo do que sinto.
Flutuo com anjos e demónios nos silêncios de mim.
Não estou ali, e nunca estive tão presente noutro qualquer lugar.
Apenas o meu corpo me denuncia nesta escuridão fingida.
Dispo-me de tudo, convoco a paz, solto a alma e sonho.
Vou em busca de sonhos perdidos ou estarei ausente perdido nos sonhos.
Não se impacientem. Eu não demoro! Eu nunca me demoro.
De pensamento em pensamento, nem reparei que a noite já matou todas as estrelas.
Sempre regresso, e regressei, usando mais uma vez uma desculpa insignificante.
Tudo na vida só pode amanhecer se existir uma noite anterior.
Esta foi a minha noite! Não a noite de todas as noites. Mas a noite que precede o amanhecer de conclusões surgidas do toque das minhas mãos nuas, na água que me reflecte.
Continuarei a ser uma metamorfose ambulante porque me recuso a ser reflexo de sonho imposto.
Não tenho ainda o necessário mas tenho a consciência da falta.
Não é a ausência do necessário que torna os meus dias vazios.
Mas a presença do superficial, que teima em preenche-los com tamanha solidão, que faz com que a ausência maior que sinto, seja de mim.
E esse segredo que o mar levou até uma distancia imprecisa, é o eco do grito de quem já teve pedaços de muito, suplicando por possuir o todo de qualquer pouco.
Qual o pouco que me falta?
Não sei!
Terei mais momentos entre o vazio e o cheio.
Mais silêncios para descobri-lo.
Mais mares para me ajudar.

26-05-2010


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