Poesia e pensamentos livres


A noite está perfeita.
Silêncio! A lei é minha o palco é meu.
Quanta magia sinto neste momento em que volto ao tempo em que as esperanças voavam de pijama. O pijama já não é o mesmo, mas é meu! Voo na mesma.
Ah! Chuva Purificadora.
Podes molhar sem piedade e gelar sem clemência.
Não estou Aqui!
Voltei ao lugar das dores dissipadas, ao recanto do esquecimento onde a solidão se expõe em todos os silêncios genuínos.
Aos poucos todos os mortos em mim, regressam pela estrada da memória.
E os que nunca partiram, cantam melodias de aleluia pela libertação de tudo o que deixei de ser enquanto fui tua.
Vou estar aqui até ao momento em que a minha pele me obrigue a outra realidade.
E sim!
É Inevitável!
Um dia perderei outra vez a lucidez e voltarei a amar.

11-11-2010




Hoje é um desses dias em que saio de mim para ser tudo no teu desejo.
Estarás tu à espera?
Estarás preparado para mim?
Fantasia!
Acordei a pensar na magia da surpresa, no desejo provocado.
Aqui estou!
Que esperas?
Se soubesses quanto amor e desejo cabe nesta roupa que me veste.
Dou-me!
Toma-me, assalta-me e descobre-me em viagem por mim numa rota de cama desfeita.

10-11-2010



Cada dia me dispo das vestes gastas de mim.
Esqueço o que fui para lembrar-me de quem sou.
Nada me chega completo porque nada procuro.
Experimento tudo vestido desse nada que carrego.
Sou realidade entre o momentâneo e o eterno.
Memória de encontros fortuitos coloridos de eternidade pelo pincel do acaso.
Transfiguro-me todos os dias com rituais tipificados na irrealidade confusa das coisas, num equilíbrio desequilibrado, na ânsia de mim no universo dos erros que cometo.
Mas sei que em mim tudo tem que ser assim.
Consequência de solidão imperfeita que arrisca na perfeita espontaneidade.
Nada será meu que eu não sinta e nada terei que não me construa.
O que disso poderia ficar é um nada de um erro clandestino.
Memórias! Só as que não matam o presente por comparação.
Memórias! Só as que não matam o presente na ânsia de futuro.
Nunca me perdoaria a angústia de pensar em corrigir erros.
Cometo outros.
As possibilidades são infinitas.
Sou maravilhosamente imperfeito e estupidamente momentâneo.
Tenho corpo para sentir o vento e uma alma para admirá-lo.
E só quero continuar a deslumbrar-me fora de mim, sem palavras inúteis, com todos os silêncios de um sorriso de admiração.
E no meio da confusão das coisas, que já não questiono, quem sabe tocar uma outra imperfeição que me complete.
Estou vivo e tudo é consequência.
E só assim me pertenço por destino meu.
Nada mais me interessa!
O meu dia chegará!
Sempre chega!
Por esse lado certo de todo o errado que existe em nós,
A vida.
06-11-2010






Sou tua!
Mas tu não sabes como te sinto.
Nem poderás saber, perdido que estás em ti e nos sonhos nos quais não me colocas.
Deixo o desejo de que um dia descubras por mero acaso quem sou, não em mim, mas em ti.
Nesse dia não penses!
Abraça-me!
O teu único erro serei eu.
E tudo o resto - acredita -, não vais necessitar.

02/11/2010





Vontades e realidades em linhas paralelas que momentaneamente se intersectam.
Ou quiçá nunca!
Tudo acontece entre tempo e tempo, entre pressa e pressa.
Gente à procura de ter pressa.
Gente com pressa da procura.
Gente calmamente com pressa, ou apressadamente calma.
Do finito ao infinito à velocidade da luz.
Quantificações simplistas de uma realidade equacionável.
Num espaço indefinido entre tudo e nada ou qualquer coisa.
Tudo está errado ou provavelmente tudo pode estar certo.

Desequilíbrios matemáticos em equações desiguais.
Demasiadas incógnitas!
Tudo existe ou inexiste e no meio disso nós.
Meio existência, um quarto de vivência e tudo o resto sonho.
Na metade de existência o todo não tem resto.
No quarto de vivência todo o meio é esquecido.
E no resto o pouco do nada que desejamos.
Quarto, meio, resto, que raio! Tanto de tão pouco faria uma equação melhor.
E tão pouco resta para não existir equação nenhuma.
E será que existe solução? tantas são as incógnitas!
Aumentar o resto elevando o quarto diminuindo o meio?
Diminuir o meio potenciando o quarto?
Resto zero, igualando quarto e meio?
E outro tanto de tantas outras.
Múltiplas combinações e nem sequer gosto de matemática.
Complicações aritméticas de uma realidade sempre a mudar as equações.
Habitamos nos subúrbios do resto alimentando-nos das memórias do quarto para engordar o meio.
Esse conjunto de metades em linhas paralelas com a unidade, com intersecções pontuais que rapidamente divergem exponencialmente.
Como seria ideal se tudo voltasse à simplicidade do um mais um igual a dois.
Mas não!
Infelizmente somos feitos de desequilíbrios conformadamente equilibrados.
Tudo se move, enquanto se move, pela majoração romântica do resto.
E mesmo que nada reste desse resto majorado, momentaneamente saímos dos subúrbios e visitamos a cidade.
E entre visita e visita quem sabe descobrimos um quarto com janela para o horizonte da materialização do resto.
Venceremos a matemática, não tenho a menor dúvida disso!
Na nossa génese já o fizemos!
Somos o resultado de uma equação num espaço tridimensional, que nasceu graças à força de contestar probabilidades ínfimas.
Simplifiquemos os teoremas reinventando a nossa lógica.
A vida será sempre superior a todas as matemáticas.
Meio, resto, quarto!
Cada dia uma nova equação.
Cada vida uma equação diferente.
A minha equação de amanhã será igual à de hoje?
Não sei!
Que o resto me domine e traga novas igualdades.
E quem sabe as nossas vidas não terão um ponto de intersecção.
No finito ou infinito!
Incógnita!
Mais uma.

24-08-2010



Perdi-te!
Dou mil voltas na cama e acabo por entender que é inútil permanecer deitado. Estou impaciente, inquieto, e com essa sensação de quem não quer pensar e não faz outra coisa que não isso mesmo. Tenho que esperar que o sono me domine ou que os pensamentos desordenados que agora me escravizam se afastem. Não importa! Levanto-me e acendo esse cigarro que reclama misericórdia à insónia. Desgraçado! Não sabe que é estandarte de rendição incondicional ao abraço da noite.

Freud disse que o cigarro é apenas um substituto da masturbação. A dar-lhe razão, já não teria mãos para nenhuma das duas sensações. Mas se os cigarros não me ajudarem experimento ambas.
Rendido à valsa das sombras de um fumo libertador (Freud pode esperar…), pergunto: - quanto destes pensamentos que me inquietam serão efectivamente meus? Sou consequência de mim, ou serei o resultado de pensamentos de mil almas de rostos incógnitos, que em mim habitam com vida própria?
Quero deixar que uma parte de mim me abandone da mesma forma que o fumo se dirige às mais pequenas frestas em busca da liberdade. Por vezes não sei se tenho voz própria ou se os sons que de mim saem são os ecos dos lamentos de um mendigo, vivendo das esmolas de alheia profecia.
Abençoada insónia que na sua clarividência me impele para aniquilar tudo o que me separa de ser profeta do meu futuro. Tenho deixado a decisão de mim para o evoluir do tempo, cobarde adiamento que me transforma numa qualquer coisa, que reza credos a um deus menor vendendo a si próprio a imagem de possuir um lugar no Olimpo.

Abençoada insónia! Ainda sem dar razão a Freud.
Algo em mim existe sem minha permissão, corre no meu sangue sem que nada até agora tenha podido fazer – se é que fiz alguma coisa!
Uma imagem, um pensamento, um sonho, uma memória, um passado, um presente ou a conjugação dos dois numa imagem de futuro? Não sei!
No desnorte invisível da minha alma sempre volto, inconscientemente, a essa terra que foi minha mas que já não tem vestígios dos meus passos. Porque tenho que entrar onde não quero e sempre sair, isso sim, desejando não estar lá?
Porque tenho que perpetuar esse movimento? Como é possível que alguém ou alguma coisa, ausente de mim, invada todos os meus espaços?
Quando parti dessa terra sei que passei a prestar vassalagem à indiferença - É normal! - Se tanto me dói assim a ausência, é porque em cada instante nesse espaço em mim existi e estive vivo. Tanto tempo a plantar um jardim cheio de árvores perfumadas para em determinado momento ter que abandonar a sua frescura e queimar-me debaixo de um sol desconhecido. As árvores levam tempo a dar-nos sombra, e eu sei que nesse momento, perdi a vontade de voltar a ser agricultor dedicado. O tempo mata-me, ou eu mato o tempo, o efeito final será sempre o mesmo. Claro que sei que essa terra há muito que deixou de ter o meu nome inscrito. Não tem os aromas do meu perfume, vestígios da minha pele, pedaços da minha alma, desejos do meu corpo. Não relata mais a minha história nem tem sonhos de mim. Está agora bem distante de tudo o que de mim está perto. Estou longe, está longe, estamos longe, bem sei! Mas continuo a relegar para secundário o importante, e continuo na sua ausência, a determinar os limites da minha essência debaixo da sombra das árvores que lá plantei.

Abençoada insónia! Ainda sem dar razão a Freud.
Sei agora que desejo descansar das reflexões e ser doente temporário vítima do esquecimento. Se a minha face fosse o reflexo do coração, o mundo contemplaria uma estátua de pedra em local incerto. Tenho-me permitido viver na dúvida, prisioneiro do passado com alma fechada, egoísta e solitária. Sou refém de uma lembrança ou uma lembrança é refém de mim. Uma memória com alma própria, e não descubro a forma de controlar as suas asas nem como impedir o seu voo. Essa terra que habitei já não corre no meu sangue, mas os meus passos seguem reféns do intervalo entre o sonho e a memória. E nesse espaço encarcero-me, convertendo-me no meu inimigo mais íntimo.

Penso que tudo me é indiferente, mas engano-me!
Engano-me ao pensar que a humanidade dos meus olhos pode cegar pela dureza de uma aparência que não tenho capacidade de sustentar;
Engano-me na ilusão de pensar que quem não venera nenhuma bandeira poderá algum dia ser pátria de alguém;
Engano-me quando penso que o mundo é meu, mas só o será no dia em que tiver consciência de que nada me falta;
Engano-me quando deixo que a vida aconteça no oriente de uma memória, porque as duas se esfumam da mesma forma;
Engano-me quando penso que posso ser livre comprometendo a minha própria construção;
Engano-me, irremediavelmente, porque com tudo o que sou, trago nos olhos um mundo que a alma não sente.

Abençoada insónia! Ainda sem dar razão a Freud.
Sei agora mais que nunca que quero despir esse fato de pedra que me veste de todas as verdades que minto. Fazer dos meus sonhos a minha única verdade, matar o que em mim já não vive mas que levo, sem saber porquê, colado nos meus passos e preso ao meu tempo. Quero estar nu de mim para me vestir por inteiro. Arrancar-me às raízes que me prendem a uma terra já distante e voltar, ainda que por momentos, a ser pertença de mim como uma flor é da terra que lhe dá vida.

A quem pertenço? Não sei!
Que pátria é a minha? Desconheço!
Mas a mim me quero prender e que, de tão efémera que seja, pareça eterna essa libertação.
Está na hora de calar os barulhos da desordem.
Quero o meu calendário e um dicionário com as minhas rimas.
Despeço-me terra distante, digo-te adeus e cuida das flores que plantei.
Nas memórias das tuas esquinas e ruas percorridas, fui perdendo a noção de quem sou.
Mas não quero ser um “quase” que morre na ideia de um “talvez”
Nem perder o “agora” rendendo-me à ideia do “nunca”.
Nada é tão alto que o sonho não lhe toque.

Tudo termina, até esta insónia. Deixo uma caneta com a tampa toda roída e um cigarro que agoniza entre dezenas de iguais.
Não dei razão a Freud!
Fecho as luzes, vou dormir!

27-07-2010


A noite está calma, a alma serena, e o meu corpo tem a leveza do vazio.
Não olho!
Não escuto!
Não paro!
Sigo decidido no trilho da ausência.
Não quero espalhar sorrisos.
Quero a fome de calar-me.
Não quero escutar palavras que me condenem nem um único som que me venere.
Sigo o percurso da fuga do tédio ruidoso.
Quero estar onde o silêncio me sente, onde escuto o meu sentir, vazio de ninguém.
Preciso dessa sensação de insignificância que tudo relega para segundo plano.
Sento-me numa pedra que não me conta a sua história e tem tanto da minha.
As primeiras estrelas iluminam um mar que geme à minha frente.
Imagino no rodopio das ondas gritos de animais selvagens enjaulados.
Tão presos quanto eu a esse espaço entre o ter e o perder a que chamamos vida.
Cada batimento das ondas contra as pedras, recorda-me esse momento finito.
No meu recanto solitário, com os olhos longínquos, transparece em surdina um segredo.
Não será escutado! Mas o azul oceânico da eternidade o levará.
Que liberdade sinto neste isolamento.
Vou fundo nos meus desejos egoístas. Estou só! O momento é meu.
Que me importa se é fantasia, se nunca na realidade me deitei em cama equilibrada.
Se nunca as minhas ânsias navegaram por mares reais.
Neste momento sou pouco do que aprendi e quase tudo do que sinto.
Flutuo com anjos e demónios nos silêncios de mim.
Não estou ali, e nunca estive tão presente noutro qualquer lugar.
Apenas o meu corpo me denuncia nesta escuridão fingida.
Dispo-me de tudo, convoco a paz, solto a alma e sonho.
Vou em busca de sonhos perdidos ou estarei ausente perdido nos sonhos.
Não se impacientem. Eu não demoro! Eu nunca me demoro.
De pensamento em pensamento, nem reparei que a noite já matou todas as estrelas.
Sempre regresso, e regressei, usando mais uma vez uma desculpa insignificante.
Tudo na vida só pode amanhecer se existir uma noite anterior.
Esta foi a minha noite! Não a noite de todas as noites. Mas a noite que precede o amanhecer de conclusões surgidas do toque das minhas mãos nuas, na água que me reflecte.
Continuarei a ser uma metamorfose ambulante porque me recuso a ser reflexo de sonho imposto.
Não tenho ainda o necessário mas tenho a consciência da falta.
Não é a ausência do necessário que torna os meus dias vazios.
Mas a presença do superficial, que teima em preenche-los com tamanha solidão, que faz com que a ausência maior que sinto, seja de mim.
E esse segredo que o mar levou até uma distancia imprecisa, é o eco do grito de quem já teve pedaços de muito, suplicando por possuir o todo de qualquer pouco.
Qual o pouco que me falta?
Não sei!
Terei mais momentos entre o vazio e o cheio.
Mais silêncios para descobri-lo.
Mais mares para me ajudar.

26-05-2010


Que seja nas tuas mãos que o meu corpo treme.
Que seja pela tua pele que o meu corpo anseia.
Que se humilhem os meus sentidos pela tua presença.
Que se incendeie o apetite na tua ausência.
Que eu não esteja presente quando tu estiveres distante.
Que tudo o que é química seja paixão.
Que o eterno seja amor.
Que tudo o resto não seja importante.
Que o importante seja o essencial.
Que o essencial não se torne supérfluo.
Que o supérfluo seja o que dispensamos.
Que o necessário seja o que temos.
Que o que temos seja nosso.
Que o que seja nosso perdure.
Que perdure o cheiro da tua pele na minha.
Que o meu corpo não tenha outro cheiro que não esse.
Que seja teu o que em mim te complementa.
Que seja meu tudo o que em ti necessites.
Que o que necessites sejam os meus anseios.
Que os meus anseios sejam os teus.
Que a tua voz faça de mim a sua canção.
Que a minha voz seja o eco dessa melodia.
Que os teus medos sejam da incerteza de não ser teu para sempre.
Que os meus sejam pela prova do contrário.
Que as tuas vitórias as celebres nos meus braços.
Que as tuas dúvidas as mates nos meus passos.
Que os teus medos sejam o motivo da minha luta.
Que os teus sonhos se fundam nos meus.
Que o teu corpo seja o meu refúgio.
Que o único que abafe a tua voz sejam os meus lábios.
Que sempre exista saudade no encontro.
Que nunca exista adeus nas despedidas.
Que o que me corrompe seja a fome do teu corpo.
Que a tua fome a mates em mim.
Que seja no poente a minha espera.
Que seja no nascente o teu regresso.
Que em mim se tatue o teu aspecto.
Que em mim nunca morra a tua imagem,
Que ela seja a minha luz o meu objecto.
Que nunca o esquecimento seja um fim,
Que se me esqueço seja de mim.
Que tudo não seja a suave brisa de um sonho.
Que se de tanto querer, assim não fui,
Que um dia eu me sinta assim.

20-05-2010


I – Tudo é temporário

A vida é o palco onde interpretamos um papel permitido pela vastidão da nossa ignorância. O que acreditamos ser do domínio conhecido num determinado momento, constituirá o vasto universo da dúvida no momento seguinte. A linha que divide o compreensível do incompreensível é definida por segundos que separam o passado, presente e futuro. De estação em estação tudo se renova, reveste-se de nova forma de novo sentido. As árvores que contemplamos perderão as suas folhas e no seu renascer ganharão outra forma e dimensão. Na natureza não existe duas criações iguais, e quando nos deitamos à sombra dessa árvore pensando que a conhecemos desde sempre, já esta nos observa com nova roupagem e nos abraça com novos braços. Nada existe eternamente mas coexiste temporariamente. Qualquer conclusão sobre a realidade ficará vazia de conteúdo pela sua não existência na mesma forma no momento seguinte. Na natureza o único permanente é a mudança. Um universo em movimento fruto da confluência entre o aparente e o concreto, a ideia e a materialização, o vazio e o preenchido, o existir e o não existir, o ser e o ser transformado. A nós, pura matéria também em transformação, cabe-nos a inevitável convivência com o incompreensível, aumentando a nossa consciência da sua vastidão. Essa é a nossa insignificância mas também a nossa grandeza. Aumentar a consciência do mutável, expandir o domínio do que nos é incompreensível, é o único papel que nos encaixa na perfeição. Interagir com a vida, adaptando-nos, utilizando a sua imprevisibilidade para proveito da experimentação, do usufruto da beleza do incerto, da inevitabilidade do erro ou da surpresa do acerto. Tudo no tempo que nos é concedido (embora por vezes lhe chamemos outras coisas…), não é mais que a consequência da luta de uma vontade ignorante na ambição da sabedoria efémera.

II – A incompreensão compreensível

A ignorância e o conhecimento têm uma relação directa. É sempre mais ignorante quem aumenta o perímetro da sua sabedoria. Tudo compreende quem nada viveu. Não tem dúvidas quem nada experimentou. A verdade é uma estrela temporária que sempre morrerá para dar lugar a outra e perpetuar a luz. É um universo de subjectivismo contextual, uma adaptação das circunstâncias, o eco da voz que se gera no subconsciente à medida que caminhamos na estrada do desconhecimento. Atravessamos a vida na periferia da ignorância, trespassando em cada aurora o universo do incompreensível, com a insignificância do que vivendo compreendemos no seu momento. Na verdade a incompreensão que nos domina é completamente compreensível. Desde logo porque a nossa construção foi planeada por arquitectos da “roda” num momento em que o homem já tinha pisado a lua. Começam nas escolas por nos incutir valores de uma sociedade que não existe. Formam-nos nas universidades para ciências que não existirão no futuro. Vendem-nos valores de respeito pelo igual, pelo aceitável, e não nos ensinam a disciplina da convivência com o diferente. Devíamos ser formatados como agentes da mudança mas pintam-nos com as cores da perpetuação do existente. Ensinam-nos e esquecem sempre que nos devem educar. Entramos com a vista turva, tementes do incerto para este processo em que nos formatam a uma realidade. Quando saímos somos completamente invisuais para a realidade que encontramos. Somos o produto de uma educação, que se tivesse a oportunidade, ensinaria um esquimó a viver do consumo de carne de vaca. Como seria ideal que nos levassem a desenvolver a nossa intuição, a potenciar a nossa unicidade, ela sim, capaz de ser alavanca da mudança. Como seria ideal que nos incutissem, não simplesmente a aceitação do estado das coisas, mas a por em questão tudo o que existe em função da sua efemeridade. Como seria uma sociedade que forma pessoas não para perguntar “que horas são” mas para questionar “que raio é o tempo”? Somos meros robots programados por uma ideia quando ao mesmo tempo a sociedade se transformou e exige outra.
"Dêem-nos o supérfluo da vida, e dispensaremos o necessário”, alguém o disse e não foi eu. E basta sair para a rua para estar rodeado das mais banais manifestações deste desconhecimento compreensível. Ideais “pret-a-porter”, procura do normalizado, ambição do superficial. A luta sangrenta pelo “ter” pelo “ser” mesmo que à custa da total aniquilação do “sentir”. A veneração do efémero em ignorante detrimento do eterno.
Quero continuar a acreditar, que esta realidade é consequência de uma ilusão imposta, vendida ou ensinada. E que todos os seus actores regressão a casa depois da sua brilhante interpretação desejando uma realidade diferente, ou simplesmente – acrescentaria eu -, uma realidade. Manipulando com liberdade a frase “Dêem-nos o supérfluo da vida, e dispensaremos o necessário” eu diria “ Formem-nos com a consciência do necessário e dispensaremos o supérfluo”.

III – A inversão da pirâmide

Mas como tentar dominar a constante mutação do real, e dessa forma aumentar o perímetro da fantástica ignorância? Como? Não sei! Vivo com isso apesar disso e por isso. Tomei consciência e aceitei que nada do que somos seremos! E nada do que fomos continuamos a ser. Somos hoje consequência do ontem vivido, seremos amanhã o reflexo do hoje construído. Um misto de realismo e alquimia, de sonho e realização, de romantismo e pragmatismo, de luta e submissão, de rebeldia e conformismo, de certeza e experimentação, de displicência e reflexão, de dúvida e compreensão. Somos e seremos! Do tudo que é nosso um pouco, do muito que é de outrem outro tanto.
A minha única convicção é saber que jamais saberei, que todas as minhas dúvidas se perpetuarão mesmo que num determinado momento me pareça o contrário. Compreendo a minha passageira condição neste mundo, e somente me dedico ao deleite da surpresa com todos os seus mistérios. Deixei de tentar compreender o incompreensível e simplesmente sinto. Não desejo um futuro de saudades do não vivido, enquanto tento compreender as razões de o não ter feito. Não desejo porque não tendo uma métrica para a saudade desvalorizaria o seu tamanho, qualquer que ele fosse. Alimento cada dia a capacidade de sentir o encanto da imprevisibilidade de um palco em transformação. Vivo esfomeado pelo sentir e aceito as consequências dessa fome. Nesta vida muito ganhei e outro tanto perdi, em proporção igual ou diferente que interessa! Perder e ganhar será sempre uma consequência! Sejamos parte activa ou meros espectadores. No primeiro caso perderemos por arriscar ganhar, no segundo por nada ter a perder. Sempre perderá mais, quem aumenta dúvida à ignorância pela vivência da realidade. A ignorância não é mensurável “ad-eternum “, diminui para quem só existe, aumenta inevitavelmente, para quem arrisca viver. A dúvida é compreensível e justificável. Muito existe na vida que não necessita de qualquer explicação, simplesmente é assim. Somos mentes temporárias que exploram um universo eterno. Uma luta tão desigual quanto fantástica. É exactamente na nossa temporalidade que reside a nossa beleza. O que é eterno nada valoriza, porque é isso mesmo, eterno! Para os mortais tudo embora temporário, pode durar uma eternidade numa consciência com lembranças. É na experimentação activa da constante transformação, que ficamos com esses quadros estáticos que imortalizaram um momento, aos quais chamamos de memórias.
Memórias!
Sorrisos que damos à vida quando esta não sorri para nós.
Memórias!
A nossa vitória sobre o tempo, a bandeira de eternidade na colina do efémero. Tudo o que fica quando tudo resto passa. Por elas vivemos por elas experimentamos, lutamos, sonhamos e erramos.
Memórias! A vitória da ignorância humilde sobre a mutação.
E se hoje for um desses dias em alguém acha que tudo acabou, que o tempo já enferrujou o que antes era um sorriso fácil, saia para rua! A vida fala, sussurra, anuncia e realiza. Tantas vezes este processo é alheio à nossa realidade, não porque não exista! Porque existe e sempre existirá! Mas porque na ânsia dos dias ou das horas não observamos os segundos. Na surdez imposta pelos barulhos dos nossos medos, perdemos a capacidade de escutar a sua voz.
Saia para a rua! Perca-se, seja ignorante e escute os sons da natureza. Valorize as horas alimente-se dos segundos. Alguém disse, ”temos direito na vida a um erro grave, a um vício inofensivo e a um amor verdadeiro”…. Seja os três, “Contemple os dias passados mas tenha os olhos voltados para a eternidade”. Decida aceitar que devemos viver pelo que nos mata e morrer pelo que nos faz estar vivos.
Não! Não sou um lunático que ou entrou no limiar do desespero, nem me rendi aquelas substâncias que o organismo não expele de forma natural. Não tive mais remédio que aceitar a inversão da pirâmide dos valores da minha existência. O que nos mata é exactamente o mesmo que nos dá vida. O tempo! A vida é em si mesma um hábito que mata. E é na forma como com ele lidamos que reside um dos segredos da felicidade abraçada ao incompreensível. Vivamos sem pensar nele, mas com ele e para ele. Sejam quais forem as circunstancias sempre teremos o poder de mudar o nosso tempo e a forma como as estações se vão apresentado aos olhos da nossa insignificância. Nada fica sempre igual e nada existe realmente. Aparência e vazio existem simultaneamente. Viver é a única maneira que conheço para poder sonhar. E sonhar a única forma que conheço de me sentir vivo.
Que seja eterno tudo o que de temporal em mim existe.
Que eu atinja a eternidade por tudo aquilo que em mim não é visível.
Enquanto vivos tudo é despedida e por isso agora me despeço com todos os sonhos do mundo que faço meus, e com este sorriso que é vosso.
Que me faz sair agora? Neste dia de sol onde agarro a vida com a força dos sonhos.
Que me faz sair agora? Nesta noite, onde a ultima lágrima secou pelo calor de todos os meus sorrisos?
Que me faz sair agora?
A certeza de que só lá fora morrerei experimentando a vida, e só com esta poderei alterar o rumo do efémero vencendo o que me mata.

11-05-2010



Derramem sobre mim a terra do mundo! Que me importa! Continuarei sempre renascendo na flor que brotará corajosa do meu descanso. Não permanecerei no silêncio da bruma, terei dias e noites de alma cativa, terei dias e noites de alma livre.
Poderei sentir a face fria, mas sei que o meu lugar é nos canteiros floridos absorvendo a luz do sol. Antes que a terra me pise, deposito a esperança nos cantos das sereias, e deixo que me conduzam pelos mares do imprevisto. Desfaço os encantos da poesia nas roupas gastas de acarretar o mundo as costas, e parto para momentos de fino cetim forrado com conchas azuis dos mares da descoberta. Como controlar a emoção que antecede a novidade, o imprevisível a surpresa? Como! Se ela é o ópio que desperta todos os desejos que me proíbo e todos os que ainda desconheço não querer proibir. Lanço-me nesse infinito que talvez só dure o segundo entre a ilusão da chegada e o abismo da partida. Mas sempre será assim! O medo do abismo não vem por estar quase sempre seguro o ”fim” no estilhaço da queda, mas pela atracção que temos ao voo livre. E aqui estou, flutuando no espaço com todos os receios e pânicos que a ausência dos pés na terra me causa. Sempre sonhei voar, em criança era pássaro veloz de um céu imaginário do qual nunca queria sair. Hoje aventuro-me nos céus porque nada tenho por certo em terra. Tudo o que vou sabendo é o resultado da ousadia de sair do refúgio da minha ignorância para o imprevisto do conhecimento. E aqui estou! Com o peso dos meus ossos nas planícies do inesperado. Sinto o vento na minha pele arfando em cada metro as dores que sempre esqueço no périplo dos inícios. Renego as leis do universo, as minhas leis! E chego a essa mesa de café num local sem história olhando ao redor como que buscando outras paisagens. Vendo ao fumo do meu cigarro a calma, empresto-lhe os pensamentos que rapidamente se desvanecem na brisa suave que entra por uma janela aberta. Não faz mal! Acendo outro com a mesma intensidade na sofreguidão da espera por ti. Explorador de terra virgem sentado num café entre o sono e o despertar. Monto o espaço com todos os requintes de um altar divino para o momento sagrado. Observo as paredes, observo os recantos, observo! Nada! Versos mortos nas paredes não contam histórias de noites com o romantismo do canto dos anjos. No silêncio que antecede a euforia do encontro, formulo a eterna pergunta! Fascina-me a descoberta pela atracção do diferente, ou pela busca do encontro com o igual que existe em mim. Sento-me! Nunca terei a vida suficiente para explicar o que não compreendo, afasto o pensamento e espero! Não serás mais o encanto de um sonho, contornos que embalam pensamentos vencidos pelo sono. Tanto te esperei! Nunca te esqueci porque nunca acontecestes. Escrevo, escrevo-te! Cartas tatuadas em pensamentos calados. Sonhos de “ontem”, devaneios românticos do “amanha”. Nunca as lerás! São palavras perdidas nos corredores da antecâmara da sala de ti. Por um sonho voltei a este café com outros dele sairei. Agora permaneço! Morram todas as palavras, afaste-se o infinito, dispam-se os anjos venerem-se os demónios e que se inicie a festa. Deixo o abraço do sonho, abro a porta para a possibilidade ou impossibilidade do esquecimento, e espero-te…

II – O Encontro

A magia do encontro poderá ser aniquilada pela desoladora solidão que espreita no virar da esquina do “depois”. Não importa! Não tememos um “não “ a confusão de um “talvez”, ou a simplicidade de um “sim”. No fundo, talvez tudo tenha o sabor do nada. E tu chegas! Num passo apressadamente curioso. Beleza madura, olhos sem brilho, apagados por alguma tristeza de momentos roubados ao teu passado. E eis-me diante de uma mulher cujo vestido esconde suaves contornos. Um decote generoso anuncia promissoras guerras de alcofa. Ah! Janela indiscreta que nunca se abre o suficiente e sempre se fecha quando começamos a sentir a sua brisa perfumada. Chegas! Sorriso meigo e olhar tímido e sentas-te. No silêncio inicial absorvo metade do teu todo, essa metade que cobres num vestido de comprovada sensualidade, mas que desnudo como um pintor desenhando silhuetas.
“Dois cafés para a mesa do fundo” …
Maldito empregado descuidado com cheiro de salgados. Tinha matar o tédio que o assola, gritando aos quatro ventos que estamos ali. No eco da sua voz aguda senti o corpo trespassado pela traição. Maldito! Não entendeu que é cúmplice de uma missão secreta, e se devia comportar como testemunha involuntária de um crime, protegendo-se no silêncio. Mas não! Acaba com o disfarce com o anonimato. E eis que todos os olhos se dirigem para os nossos, como que procurando os responsáveis pelo aniquilar do silêncio. Não olhamos! Como desejamos que não fosse connosco. Na verdade não queremos estar ali! Simplesmente algo nos levou à mesa de um café em mais uma noite de todos os despropósitos. As mãos com suaves movimentos acariciam os cantos de uma chávena de café convertido na arena romana do deleite de todos os anseios. No fundo da chávena, o abismo! O voo solitário escondido em suaves golos de desassossego.
Maldito empregado!
Não entende que somos reféns do sentido de todos os sentidos. Que o seu grito automático nos faz sentir fugitivos de um “não sei quê” que sempre nos levará a um “não sei donde”. Vestimos a alma com segredos, perfumamo-nos de coragem envergonhada e carregamos o barco de palavras náufragos de pátria à vista.
- Olá! Como estas?
- Fala-me de ti?
- Que te leva a estar aqui?
- A história da minha vida em cinco minutos? Queres?
Penso! Mais umas quantas páginas da colectânea sobre a superficialidade.
E tu falas! Para quê? Eu não escuto. Nunca perceberás a preocupação que me invade em não te ouvir, em te alhear do espaço onde me tocas sem te sentir. Não é o desinteresse teatralmente interessado que mais me incomoda, mas esse grito interior que a indiferença gera nas asas do silêncio. Avançamos com alma assassinada ou de assassino tudo depende da ocasião. Esquecemos que o domínio da linguagem dá razão à arte de escutar, e falamos! Falamos porque nada mais nos resta! Temos que matar um tempo que nunca será nosso. Ah! Se pudesses fechar os olhos para ver, e com eles abertos conseguisses estar simplesmente calada. Ah! Se pudesses, saberias, que tal como tu, simplesmente fujo de mim, das minhas inquietudes. Desnatamos o leite da indiferença tentando coar o isolamento de consciências congeladas. Nada digo de mim, que interessa se ninguém escuta, se tu não escutas, se eu não quero escutar. Tu sabes que é assim e fazes o mesmo, mas dissimulas. Dissimulamos! Impossível fazer passar um icebergue pela peneira frágil do despropósito. Não interessa! Nada interessa! Seguimos. Subimos os degraus da escada do cansaço da inconsequência, vestidos de fantasias no palco da dissimulação. Dizemos o que as palavras calam, partilhamos o descartável, escondemos o essencial. Cada palavra, cada olhar, cada paragem para escutar são movimentos na periferia da caverna onde guardamos o quadro abstracto de mentes abandonadas. Subimos! Chegaremos cansados e iniciaremos o striptease atingindo essa desnudes vestida do que não somos. Partimos ao meio o uno indivisível da memória fugaz, e sentamo-nos na mesa de um jogo de “Poker” que não terá vencedor ou vencido, apenas jogadores compulsivos. Cinzeiros repletos de desvios da memória jazem com o peso de cigarros consumidos em pensamentos ausentes. Sorrimos para uma imagem sem reflexo. Colagens! Pedaços rasgados de jornais sem substância pendurados numa parede exígua, que nunca guardará memórias das palavras verdadeiras. Confidências, Nunca! A única coisa que te beija, que te sente a pele, é o fumo desse cigarro onde descanso pensamentos sobre todas as vozes de mim ausentes. Tenho que te fazer sorrir, porque o sorriso abre o agora e rende o depois. Sorrirás! Seguindo os meus sorrisos expressos em dentes convenientemente lavados, mas nunca terás o sorriso genuíno do brilho de uma alma que aprova o momento. Nunca saberei! Que brinquedos são a estrada do teu sonho. Que histórias te embalam. Se tens medo na noite e que braços te abrigam. O teu cheiro depois do banho e que champô te acaricia o cabelo. O perfume que te toca na pele, os sapatos que te crescem, a roupa que te liberta, o que te mata, o que te dá vida. Nunca saberei! Nunca arriscarei sentir que o metodicamente desejado, acaba por ser inferior ao que não quero que de mim fique ausente. Caminhos de ilusão percorridos por corações mortos que nunca terão o hino do uníssono. Rasgaremos as fotos que nunca tiramos das lembranças que nunca tivemos. Apagaremos os traços inscritos nos papéis em que momentaneamente escrevíamos mensagens estéreis, apagaremos a tinta de nós. Quais nós! Se quando a chávena estiver vazia talvez já nem nos lembraremos quem éramos, se fomos na realidade qualquer coisa? Entendo! Claro que entendo o quão frágil é o que nos une quando comparado com a imensidão do caminhos que nos separam. Claro que sei! Mas não digo. Continuarei até ao fim olhando as estrelas adorando a lua, como que fascinado por esse universo sem explicação. Cada estrela uma dúvida, o céu a vasta ignorância, a lua esse ponto onde me apoio num silêncio que corta o vazio que me perde. Ah! Se eu pudesse cinzelar nos memoriais da história a poesia do meu agradecimento à vida. Ah! Se eu pudesse colorir as cidades com os meus sonhos. Ah! Se me deixassem cimentar as estradas com a minha alquimia encher os caminhos com a beleza que sinto. Ah se me dessem as asas da liberdade de poder dizer ao mundo o quanto ele é belo aos olhos da minha eternidade. Ah! Se esse dia chegar não voltarei a este café.

III – A Despedida

Fixo o teu olhar. Sei que percorres as planícies da tua vida, que os sonhos te invadem. Que escondes as desilusões tidas que esquecestes para estar aqui. Teus lábios cantam movimentos de sensualidade e o teu corpo sintonias perfeitas com maestro à altura. Mas tudo é contido camuflado, metódico, matemático. Ciência no exacto palco do inexacto. A noite já vai longa, a lua já mostra lá no alto o seu sorriso para a humanidade. Cada gesto, cada respiração mais profunda muda a rota, abre uma janela por onde posso vislumbrar o céu. Consigo imaginar os anjos a cantar cânticos nostálgicos, árias de glorificante prenúncio de novo dia. Chegou a amanha! Não sei se chegará a mudança nos segredos apreendidos, mas deixarei essa janela sempre bem aberta para que o silêncio dos ecos desses cantos tudo me possam contar. Tantas perguntas sem resposta, tantas respostas sem perguntas. Mas já sabíamos que o enredo só teria a arte de perguntar e responder com as letras minúsculas da desconfiança. Abriste um pouco da “janela” do quarto dos teus segredos, mas eu só serei o vento que por ela passou. Não me conheço nos meus sorrisos, nos sons que calo, nas palavras que suo. Saio de ti sem nunca em ti ter entrado, saio! Nunca saberás que o meu “eclipse” é essa mulher ponte entre mim e a vida. Essa mulher que me faça acreditar num passado com futuro. Essa mulher feita de procura que em mim encontra. Essa mulher que faça de mim o sonho. Essa mulher que saiba o valor do amor por já ter amado, que tenha vivido para saber viver, sofrido para saber entender, chorado para saber perdoar, perdido para desejar dar, partido desejando em mim chegar. Não serás nunca tu! E eu nunca saberei o que me trouxe até aqui. Enquanto nos perdemos no sonho do ideal, na ânsia da perfeita imperfeição a alma lacrimeja. Clama pelo nosso aceitar da simplicidade das virtudes e transparência dos defeitos que nos fazem. Buscamos o alheio e choramos pelo nosso. Levantas-te! Dás esses cinco passos até à porta por onde sais como que numa viajem para um novo apeadeiro. Eu sei, tu também! Não podia ser de outra maneira. Conhecemo-nos num não lugar, num não momento, entre o ser e o não ser, aniquilados pela distância que vai de nós a nós. Os pés assentes num chão manipulado, o tempo um intervalo entre a tentativa frustrante do encontro e a consciência do desejo de estar perdidos em qualquer outro caminho. Passos movidos pela irracionalidade vão esgotando a água dos poços onde subsiste uma réstia de humanismo para evitar a desidratação da alma.

- Fica bem! Adorei estes momentos (termina como começou…… retórica conveniente) temos que marcar outro encontro um qualquer dia.

Troquei! Trocamos! A água que nos sustenta por este beijo com aroma de café. Viajamos com a cegueira imposta pela venda que nos colocamos, e no nosso pesadelo afogamos o sangue das nossas veias na virtual procura do encontro. Nunca superaremos o amanha porque nunca construiremos o hoje. Nunca serás a árvore dos meus frutos, mas talvez! Talvez! A fonte da incoerência, a cor da lama, o castigo ardente que necessito para enxertar na minha pele seca as dores da subida às montanhas do impossível. Aqui foi enterrado mais um momento supérfluo. Nada ficará escrito por ti ou por mim. Tudo o que não foi dito será um dia a nossa obra completa. Não habitarás as minhas lembranças, os poemas na insónia da ilusão da esperança. Ah! Pobre coração! Nunca digas “nunca” e nunca digas “sempre”. Não morras no desespero do desencontro subjugado à tirania dos segundos sem horas. Não desistas de ter o que o sonho pretende, de ser o que o sonho comanda, de ter dias em que alcanças porque mataste todos os outros em que só o desejastes. Não desistas frágil coração! Não desistas de bater, não desistas do “eclipse”, não desistas de mim.

Não será por ti! Mas eu sei que um dia voltarei a este café….

26-08-2009



Ah meus queridos Poetas! Tanta falta fazem ao mundo, tanta falta nos fazem.

O mundo precisa de alma, de palavras simples e não de simples palavras, de sentimento genuíno em detrimento do calculismo metafórico, de emoção e não de frieza matemática. O mundo necessita da palavra perdida que deu eternidade a um momento, e não de momentos escolhidos para dar eternidade à palavra.
O mundo clama pelos verdadeiros poetas.
A nossa grandeza fundiu-se com a nossa miséria. Somos marginalizados por todos os que engolem a realidade como alimento de vida, e idolatrados por todos aqueles que se alimentam do sentido do ser da essência do existir. Todos aqueles que saciam a sua sede nas águas do não visível - mas onde estão esses que não os sinto presentes- . Quem nos manda adormecer quando toda a humanidade está desperta? Vendo o invisível, pensando o impensado, parando o contínuo, avançando o estático, compreendo o incompreensível, avançando na interrogação, interrogando a conclusão, concluindo o inverificado, verificando o inconclusivo, brincamos como uma criança para quem nada é mentira, e o impossível unicamente uma verdade que ainda não aconteceu.
Loucura meus caros poetas! Mera loucura!
Essa que é a fonte onde tudo o que é nosso se manifesta de verdade. No refúgio da normalidade, garantia da não contradição com as consciências generalizadas, de nada valemos. A nossa razão de existir está nos antípodas da constatação do todo indivisível e sobressai unicamente na dissecação do particular do qual o todo se compõe, mesmo que únicamente aos nossos olhos. E tudo isto enquanto o mundo lá fora nos analisa sentados nas suas poltronas construídas da realidade perceptível. Essa realidade na qual descansam verdades que não contestam, porque nunca ousarão morrer na razão para viver no sonho.

Ah meus queridos Poetas! Tanta falta fazem ao mundo, tanta falta nos fazem.

Passamos a nossa vida sem dar conta que o importante foi ter tempo para sentir saudade de um outro qualquer tempo. Seremos sempre livres, as únicas prisões, são as que nos coloca a bicéfala consciência que das contradições faz grades. Poderá a humanidade viver sem a poesia, Talvez!Mas nunca a existência de um poema será uma realidade sem a consciência insana de um poeta. Só um louco poderia ousar reduzir as dimensões da vida à palavra, parágrafo, sentença, ideia ou conclusão. Só um louco poderia viver nessa agonia da necessidade de sentir a “palavra precisa” para explicar o inexplicável, transmitir o invisível. Só um louco poderia compreender que nessa loucura é, quase sempre um “agrilhoado” às correntes da sua própria dimensão de loucura e, mesmo assim, assumir-se escravo voluntário e continuar. Mas sempre teremos esse “espelho mágico” que nos mente e sempre nos dirá que das palavras não somos meros escravos ou vítimas, mas sim amantes, senhores, concubinos, mestres. Mentiras que relaxam uma consciência perdida na busca da ignorância através do refúgio da sabedoria. E se a nossa consciência descansa, o corpo, esse sucumbe, exausto perante as rotinas de um processo abençoado pela fortuna e amaldiçoado por nós. O dia em que encontrar um poeta satisfeito com a materialização da sua loucura em palavras, encontrarei alguém que desconhece completamente o significado de “ser poeta”. A insatisfação é a nossa maldição e bênção. Nunca ninguém, no seu perfeito juízo, decidiu ser poeta. Isso será sempre, consequência de uma submissão incontrolável à escravidão para se ser live.
A poesia é para os verdadeiros poetas uma escrava libertação.
Nunca seremos livres no verso e é perdidos no inverso das coisas que atingimos o nível dos profetas livres eternamente sós.

Ah meus queridos Poetas! Tanta falta fazem ao mundo, tanta falta nos fazem.

E eu! Um poeta sem rumo ou com rumo desconhecido, com a poesia ou pela poesia um dia partirei para outra dimensão. Partirei sim Partirei! Com todos os diálogos que silenciei, com todos os poemas que matei, cheio de tudo e vazio de outro tanto. Mas enquanto aqui permanecer podem continuar a rir de mim ou para mim. Tive tudo e outro tanto já perdi. Sei que sou o que vivi e o que vivendo aprendi, ou talvez nada disso ou disso um pouco. Talvez não seja o que de mim penso ou o que pensam de mim. Serei sempre o que experimentei vivendo ou vivi sonhando, e nunca o que realizei. Sou o que ainda não sei, e por não saber quem sou, escrevo o que penso que me faz. Carrego o fardo pesado da dúvida, sei que existe uma solução para me libertar do peso desse manto, mas ainda a desconheço. Sou vítima fora de tempo, sou vítima dentro de mim.
Procurar as razões! Para que?
Se todos um dia tivemos razão e nenhum de nós individualmente a chegou a ter.
Qual razão? A minha, a vossa, a deles. Qual?
Vivo da ausência delas, cantando sensações do maravilhoso mundo que idealizo com a humilde materialização dos sentimentos que me avassalam. Tudo desconheço e por nada possuir eternamente meu, tudo o que de mim sai é o nada desnudo do muito que em mim sinto.

Ah meus queridos Poetas! Tanta falta fazem ao mundo, tanta falta nos fazem.

Aromas da poesia inalamos em qualquer espaço ou momento, mas é aí, exactamente aí, em que morrem os mercenários e nascem os poetas, Só existe uma forma de ver o que não está à nossa frente e essa forma nunca será racional. Tudo o que resulte da razão até poderá ter o seu momento, mas nunca mais do que isso – Um momento. Para lá das montanhas sombrias da vida existem planícies plantadas de flores multicolores que devem ser cantadas, melodias que devem ser soletradas em silêncio ou em cânticos de multidões. Nunca aprendi a forma ideal de um poema. Nem quero! Nunca saberei escrever algo que não seja o reflexo das cores com que idealizo o que se coloca diante dos meus olhos. Nunca ninguém receberá de mim outra coisa do que não seja meu, não por direito próprio, mas porque a vida mo deu. Se escrevo não é porque sei ou porque deva, (estou longe de me preocupar com isso…), não é com técnica (nem sei o que isso é…). Escrevo porque estou vivo, e caminhando na minha vivência sempre existem esses momentos em que os relatos que me saem mais não são que a única forma que encontro para me explicar a mim e ao mundo. Posso até estar só! Ou por vezes com a sorte de partilhar o mesmo espaço com todos aqueles para quem a poesia são pequenos traços num quadro abastracto que imortalizou um momento.
Mas só ou com os outros loucos como eu!
Continuarei poeta, porque enquanto vivo, seguirei sonhando.

Ah meus queridos Poetas! Tanta falta fazem ao mundo, tanta falta nos fazem.

22-03-2010


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