Poesia e pensamentos livres

Mostrar mensagens com a etiqueta prosa. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta prosa. Mostrar todas as mensagens


Perdi-te!
De tão profundo que foi este meu não querer, só me encontrei no teu adeus.
Esqueci-me de ti nas pequenas e grandes coisas, nessa solidão estúpida em que sou sombra do teu sonho.
Fiz de errante ilusão a razão da minha invisibilidade.
Não duraste! Nada dura em mim mais que o fácil com a duração do pouco.
Na pele suam todos os silêncios de vozes que não me pertencem.
De dia sou nulidade, de noite não sou de um lugar nem de outro.
E no resto do tempo vivo tentando chegar às margens de ti.
Como não te posso esperar, se todo o meu tempo é saudade.
Sem ti não sou palavra, nem poema, nem absolutamente nada que valha a pena.
Como explicar-te!
Que a tua ausência não cabe em mim.
Que me dói o fim de um querer que permitiu a perda.
Que só existo na metade da vida que não inventei.
No púlpito da minha ignorância sou mero escravo de mãos ausentes.
Não te valorizei e nos teus restos não encontro forma de ser sozinho.
A minha solidão só em ti encontra adequada companhia.
Nunca escutei nem conversei com os teus segredos.
E sempre o meu egoísmo me exigiu ser parte deles.
No que não te disse acabei por falar o que devia ter calado.
Perdoa-me! A imperfeição de ter vivido para a minha criação e não para mim.
Que se eu fui assim planeado quero o resto de mim que caiba no teu sonho.
Não posso lembrar-me do que esqueci mas todos os sonhos falam de ti.
Quero uma nova história, uma oportunidade num novo tempo.
Deposito na esperança do perdão a minha única glória.
E se no que agora desejo vires valor, esquece-me a mim, o melhor de mim só existe fora da minha vontade.
Agora sou do tamanho que me quiseres dar e que em mim consigas ver.
Mas consente-me este desejo do recomeço, porque nada mais me resta do fracasso.
E se este humilde grito não te trouxer de volta,
que o que de mim em ti reste, por inteiro assim o guardes.
Porque se todas as vozes me levam ao caos da culpa,
todas as outras se calam porque de mim nunca partistes.

16/01/2015

Talvez!
Talvez um dia escreva!
(...)
Talvez escreva para ser desimportante.
Talvez escreva para ser proporção, fragmento, parte.
Talvez escreva porque sou escasso.
Talvez escreva porque sou do tamanho dessa insignificância.
Talvez escreva porque não tenho outro espelho que me minta.
Talvez escreva porque me falta tudo o que tenho e não me alcanço.
Talvez escreva porque tenho fé no desassossego.
Talvez escreva porque estou em transito.
Talvez escreva porque sou erro incompleto.
Talvez escreva porque é errado.
Talvez escreva porque uma parte de mim esta perdida e a outra teima em acompanha-la.
Talvez escreva para me organizar, definir, reconstruir.
Talvez escreva para entender o pensamento.
Talvez escreva porque sou incógnito nessa festa.
Talvez escreva porque sou tentativa mal sucedida de ser parte de outra parte.
Talvez escreva porque quero mais do menos que me completa.
Talvez escreva porque é tarde, estou cansado e não tenho pressa de mais nada.
Talvez escreva porque quero ser culpado de tentar.
Talvez escreva porque não vejo outra saída.
Talvez escreva porque sou infantil ou infantilmente nisso acredito.
Talvez escreva porque ninguém respira perto de mim e o ar de mim é só meu
Talvez escreva porque estou perdido na calma.
Talvez escreva porque não tenho motivo.
Talvez escreva porque não tenho perguntas.
Talvez escreva porque não tenho respostas.
Talvez escreva porque não sei sair do princípio.
Talvez escreva porque me é tão difícil fazê-lo.
Talvez escreva porque me minto e acredito.
Talvez escreva porque me dói e nessa dor à perdão.
Talvez escreva com propósito ou sem ele.
Talvez escreva porque amanha me esqueço.
Talvez escreva porque adormeço.
Talvez escreva porque quero.
Talvez escreva porque não tenho alternativa
Talvez escreva porque sou vago, rua, noite , abandono.
Talvez escreva porque ninguém lê.
Talvez escreva porque me calo.
Talvez escreva porque sou começo.
Talvez escreva porque sou fim.
Talvez escreva porque sou nada.
(...)
Talvez!
Talvez um dia escreva!

27/08/2014




Nada será como antes, porque o antes já não é o que nos faz. O agora é o antes de um depois que nos fará...

O passado é o anexo
De presente já vivido
O futuro um reflexo
De presente construído

Tudo muda! Somos matéria em transformação...
A ânsia de liberdade e a imagem de escravidão.
O amor desejado, o amor experimentado
O amor contratado o amor vendido.
A paixão fugaz, a paixão que permanece
A paixão que toca a que se esquece.
O sonho vestido, o sonho despido
O sonho partilhado, o sonho isolado.
O valor da amizade, a amizade sem valor.
A tirania das horas o abraço dos dias.
O balanço dos anos o evoluir das estações.
A floresta vislumbrada a árvore escolhida.
A flor que perfuma a flor que afasta.
A poesia do mar a excitação do sol.
A melancolia da lua o romantismo do deserto.
A calma apaixonante da montanha.
A sublime paz da planície.
A melodia urbana a sinfonia campestre.
A crescente consciência da insignificância de nós.

Nada será como antes, porque o antes já não é o que nos faz. O agora é o antes de um depois que nos fará...

Tudo muda! Somos matéria em transformação.....
A dor da distância a espera na ausência.
A monotonia que não adormece a alma.
A agitação que já não traz virtual felicidade.
Os silêncios que matam os ruídos que ferem.
O despertar com a calma da experiência.
O Desejo do corpo.
O sentir do toque o cheiro da pele.
O sabor do beijo o Calor do abraço.
O apelo da cama a química do sexo.
Os passeios matinais as estradas nocturnas.
Os caminhos virgens os caminhos sem segredos.
Os becos com saída os becos sem saída.
A estação de partida a paragem refrescante.
A estação de chegada a despedida marcante.
O ouro no final do Arco-íris
A procura o encontro

Nada será como antes, porque o antes já não é o que nos faz. O agora é o antes de um depois que nos fará…

Tudo muda! Somos matéria em transformação.....
O apelo transmitido
O grito interior o grito exterior
A virtude pretendida e o pecado desejado
A virtude escondida o defeito simulado.
O suspiro abandonado e o suspiro partilhado.
A lágrima solta a lágrima presa.
O livro folheado o que já foi abandonado.
A música escutada a música afastada.
A pintura observada a pintura ignorada.
A humildade genuína o humanismo altruísta.
A tolerância com cor a serenidade daltónica.
A eternidade desejada o sentido da indiferença.
O singular.
O plural.

Nada será como antes, porque o antes já não é o que nos faz. O agora é o antes de um depois que nos fará…

Tudo muda! Somos matéria em transformação.....
O respeito esperado a dádiva genuína.
O presente hipócrita a esperança realista.
O consentimento cansado o abdicar com naturalidade.
O exigir com autoridade o compreender entendendo.
O aceitar sem reservas.
A espera agitada a espera com calma.
A indiferença que mata
A indiferente indiferença.
A memória que vive
A memória que morre.
A saudade consciente a saudade inconsciente.
O fato que não nos cabe
O fato com o qual saímos.
O espelho que nos reflecte
O espelho que nos apaga.
A importância das palavras.
O desafio do silêncio.
A paz.

Nos! Essa massa de certezas sobre duvidas….
Nos! Essa mutação que deseja...

Permanecer fluindo,
Existir modificando,
Viver renascendo,
Amar compreendendo.
Caminhar com alquimia,
Entregar sem hipocrisia,
Respirar em liberdade,
Desgastando a juventude
Sonhando plenitude.
A mudança somos nós,
Nesta breve procissão,
Temos nas costas o andor,
De corpo em transformação.
A mudança somos nós,
Enquanto o conceito existir,
Seremos o que nos faça,
Constante chegar e partir.
Seres cuja desgraça
É uma grande certeza
Ser finitos no que passa
Sua única grandeza

Seremos passado presente e futuro, nesses milésimos de segundo que separam os conceitos. Acabei de escrever e o "agora" é já o "antes" do futuro onde estou!
Como serei? Transformado em futuro, vestido de presente num corpo passado?
Como serei? Saberei brevemente porque o futuro acaba de me bater à porta...
Desculpem mas tenho que abrir.
Encontramo-nos lá!
28-07-2009



Cada dia me dispo das vestes gastas de mim.
Esqueço o que fui para lembrar-me de quem sou.
Nada me chega completo porque nada procuro.
Experimento tudo vestido desse nada que carrego.
Sou realidade entre o momentâneo e o eterno.
Memória de encontros fortuitos coloridos de eternidade pelo pincel do acaso.
Transfiguro-me todos os dias com rituais tipificados na irrealidade confusa das coisas, num equilíbrio desequilibrado, na ânsia de mim no universo dos erros que cometo.
Mas sei que em mim tudo tem que ser assim.
Consequência de solidão imperfeita que arrisca na perfeita espontaneidade.
Nada será meu que eu não sinta e nada terei que não me construa.
O que disso poderia ficar é um nada de um erro clandestino.
Memórias! Só as que não matam o presente por comparação.
Memórias! Só as que não matam o presente na ânsia de futuro.
Nunca me perdoaria a angústia de pensar em corrigir erros.
Cometo outros.
As possibilidades são infinitas.
Sou maravilhosamente imperfeito e estupidamente momentâneo.
Tenho corpo para sentir o vento e uma alma para admirá-lo.
E só quero continuar a deslumbrar-me fora de mim, sem palavras inúteis, com todos os silêncios de um sorriso de admiração.
E no meio da confusão das coisas, que já não questiono, quem sabe tocar uma outra imperfeição que me complete.
Estou vivo e tudo é consequência.
E só assim me pertenço por destino meu.
Nada mais me interessa!
O meu dia chegará!
Sempre chega!
Por esse lado certo de todo o errado que existe em nós,
A vida.
06-11-2010






Sou tua!
Mas tu não sabes como te sinto.
Nem poderás saber, perdido que estás em ti e nos sonhos nos quais não me colocas.
Deixo o desejo de que um dia descubras por mero acaso quem sou, não em mim, mas em ti.
Nesse dia não penses!
Abraça-me!
O teu único erro serei eu.
E tudo o resto - acredita -, não vais necessitar.

02/11/2010





Vontades e realidades em linhas paralelas que momentaneamente se intersectam.
Ou quiçá nunca!
Tudo acontece entre tempo e tempo, entre pressa e pressa.
Gente à procura de ter pressa.
Gente com pressa da procura.
Gente calmamente com pressa, ou apressadamente calma.
Do finito ao infinito à velocidade da luz.
Quantificações simplistas de uma realidade equacionável.
Num espaço indefinido entre tudo e nada ou qualquer coisa.
Tudo está errado ou provavelmente tudo pode estar certo.

Desequilíbrios matemáticos em equações desiguais.
Demasiadas incógnitas!
Tudo existe ou inexiste e no meio disso nós.
Meio existência, um quarto de vivência e tudo o resto sonho.
Na metade de existência o todo não tem resto.
No quarto de vivência todo o meio é esquecido.
E no resto o pouco do nada que desejamos.
Quarto, meio, resto, que raio! Tanto de tão pouco faria uma equação melhor.
E tão pouco resta para não existir equação nenhuma.
E será que existe solução? tantas são as incógnitas!
Aumentar o resto elevando o quarto diminuindo o meio?
Diminuir o meio potenciando o quarto?
Resto zero, igualando quarto e meio?
E outro tanto de tantas outras.
Múltiplas combinações e nem sequer gosto de matemática.
Complicações aritméticas de uma realidade sempre a mudar as equações.
Habitamos nos subúrbios do resto alimentando-nos das memórias do quarto para engordar o meio.
Esse conjunto de metades em linhas paralelas com a unidade, com intersecções pontuais que rapidamente divergem exponencialmente.
Como seria ideal se tudo voltasse à simplicidade do um mais um igual a dois.
Mas não!
Infelizmente somos feitos de desequilíbrios conformadamente equilibrados.
Tudo se move, enquanto se move, pela majoração romântica do resto.
E mesmo que nada reste desse resto majorado, momentaneamente saímos dos subúrbios e visitamos a cidade.
E entre visita e visita quem sabe descobrimos um quarto com janela para o horizonte da materialização do resto.
Venceremos a matemática, não tenho a menor dúvida disso!
Na nossa génese já o fizemos!
Somos o resultado de uma equação num espaço tridimensional, que nasceu graças à força de contestar probabilidades ínfimas.
Simplifiquemos os teoremas reinventando a nossa lógica.
A vida será sempre superior a todas as matemáticas.
Meio, resto, quarto!
Cada dia uma nova equação.
Cada vida uma equação diferente.
A minha equação de amanhã será igual à de hoje?
Não sei!
Que o resto me domine e traga novas igualdades.
E quem sabe as nossas vidas não terão um ponto de intersecção.
No finito ou infinito!
Incógnita!
Mais uma.

24-08-2010



A noite está calma, a alma serena, e o meu corpo tem a leveza do vazio.
Não olho!
Não escuto!
Não paro!
Sigo decidido no trilho da ausência.
Não quero espalhar sorrisos.
Quero a fome de calar-me.
Não quero escutar palavras que me condenem nem um único som que me venere.
Sigo o percurso da fuga do tédio ruidoso.
Quero estar onde o silêncio me sente, onde escuto o meu sentir, vazio de ninguém.
Preciso dessa sensação de insignificância que tudo relega para segundo plano.
Sento-me numa pedra que não me conta a sua história e tem tanto da minha.
As primeiras estrelas iluminam um mar que geme à minha frente.
Imagino no rodopio das ondas gritos de animais selvagens enjaulados.
Tão presos quanto eu a esse espaço entre o ter e o perder a que chamamos vida.
Cada batimento das ondas contra as pedras, recorda-me esse momento finito.
No meu recanto solitário, com os olhos longínquos, transparece em surdina um segredo.
Não será escutado! Mas o azul oceânico da eternidade o levará.
Que liberdade sinto neste isolamento.
Vou fundo nos meus desejos egoístas. Estou só! O momento é meu.
Que me importa se é fantasia, se nunca na realidade me deitei em cama equilibrada.
Se nunca as minhas ânsias navegaram por mares reais.
Neste momento sou pouco do que aprendi e quase tudo do que sinto.
Flutuo com anjos e demónios nos silêncios de mim.
Não estou ali, e nunca estive tão presente noutro qualquer lugar.
Apenas o meu corpo me denuncia nesta escuridão fingida.
Dispo-me de tudo, convoco a paz, solto a alma e sonho.
Vou em busca de sonhos perdidos ou estarei ausente perdido nos sonhos.
Não se impacientem. Eu não demoro! Eu nunca me demoro.
De pensamento em pensamento, nem reparei que a noite já matou todas as estrelas.
Sempre regresso, e regressei, usando mais uma vez uma desculpa insignificante.
Tudo na vida só pode amanhecer se existir uma noite anterior.
Esta foi a minha noite! Não a noite de todas as noites. Mas a noite que precede o amanhecer de conclusões surgidas do toque das minhas mãos nuas, na água que me reflecte.
Continuarei a ser uma metamorfose ambulante porque me recuso a ser reflexo de sonho imposto.
Não tenho ainda o necessário mas tenho a consciência da falta.
Não é a ausência do necessário que torna os meus dias vazios.
Mas a presença do superficial, que teima em preenche-los com tamanha solidão, que faz com que a ausência maior que sinto, seja de mim.
E esse segredo que o mar levou até uma distancia imprecisa, é o eco do grito de quem já teve pedaços de muito, suplicando por possuir o todo de qualquer pouco.
Qual o pouco que me falta?
Não sei!
Terei mais momentos entre o vazio e o cheio.
Mais silêncios para descobri-lo.
Mais mares para me ajudar.

26-05-2010


Que seja nas tuas mãos que o meu corpo treme.
Que seja pela tua pele que o meu corpo anseia.
Que se humilhem os meus sentidos pela tua presença.
Que se incendeie o apetite na tua ausência.
Que eu não esteja presente quando tu estiveres distante.
Que tudo o que é química seja paixão.
Que o eterno seja amor.
Que tudo o resto não seja importante.
Que o importante seja o essencial.
Que o essencial não se torne supérfluo.
Que o supérfluo seja o que dispensamos.
Que o necessário seja o que temos.
Que o que temos seja nosso.
Que o que seja nosso perdure.
Que perdure o cheiro da tua pele na minha.
Que o meu corpo não tenha outro cheiro que não esse.
Que seja teu o que em mim te complementa.
Que seja meu tudo o que em ti necessites.
Que o que necessites sejam os meus anseios.
Que os meus anseios sejam os teus.
Que a tua voz faça de mim a sua canção.
Que a minha voz seja o eco dessa melodia.
Que os teus medos sejam da incerteza de não ser teu para sempre.
Que os meus sejam pela prova do contrário.
Que as tuas vitórias as celebres nos meus braços.
Que as tuas dúvidas as mates nos meus passos.
Que os teus medos sejam o motivo da minha luta.
Que os teus sonhos se fundam nos meus.
Que o teu corpo seja o meu refúgio.
Que o único que abafe a tua voz sejam os meus lábios.
Que sempre exista saudade no encontro.
Que nunca exista adeus nas despedidas.
Que o que me corrompe seja a fome do teu corpo.
Que a tua fome a mates em mim.
Que seja no poente a minha espera.
Que seja no nascente o teu regresso.
Que em mim se tatue o teu aspecto.
Que em mim nunca morra a tua imagem,
Que ela seja a minha luz o meu objecto.
Que nunca o esquecimento seja um fim,
Que se me esqueço seja de mim.
Que tudo não seja a suave brisa de um sonho.
Que se de tanto querer, assim não fui,
Que um dia eu me sinta assim.

20-05-2010


I – Tudo é temporário

A vida é o palco onde interpretamos um papel permitido pela vastidão da nossa ignorância. O que acreditamos ser do domínio conhecido num determinado momento, constituirá o vasto universo da dúvida no momento seguinte. A linha que divide o compreensível do incompreensível é definida por segundos que separam o passado, presente e futuro. De estação em estação tudo se renova, reveste-se de nova forma de novo sentido. As árvores que contemplamos perderão as suas folhas e no seu renascer ganharão outra forma e dimensão. Na natureza não existe duas criações iguais, e quando nos deitamos à sombra dessa árvore pensando que a conhecemos desde sempre, já esta nos observa com nova roupagem e nos abraça com novos braços. Nada existe eternamente mas coexiste temporariamente. Qualquer conclusão sobre a realidade ficará vazia de conteúdo pela sua não existência na mesma forma no momento seguinte. Na natureza o único permanente é a mudança. Um universo em movimento fruto da confluência entre o aparente e o concreto, a ideia e a materialização, o vazio e o preenchido, o existir e o não existir, o ser e o ser transformado. A nós, pura matéria também em transformação, cabe-nos a inevitável convivência com o incompreensível, aumentando a nossa consciência da sua vastidão. Essa é a nossa insignificância mas também a nossa grandeza. Aumentar a consciência do mutável, expandir o domínio do que nos é incompreensível, é o único papel que nos encaixa na perfeição. Interagir com a vida, adaptando-nos, utilizando a sua imprevisibilidade para proveito da experimentação, do usufruto da beleza do incerto, da inevitabilidade do erro ou da surpresa do acerto. Tudo no tempo que nos é concedido (embora por vezes lhe chamemos outras coisas…), não é mais que a consequência da luta de uma vontade ignorante na ambição da sabedoria efémera.

II – A incompreensão compreensível

A ignorância e o conhecimento têm uma relação directa. É sempre mais ignorante quem aumenta o perímetro da sua sabedoria. Tudo compreende quem nada viveu. Não tem dúvidas quem nada experimentou. A verdade é uma estrela temporária que sempre morrerá para dar lugar a outra e perpetuar a luz. É um universo de subjectivismo contextual, uma adaptação das circunstâncias, o eco da voz que se gera no subconsciente à medida que caminhamos na estrada do desconhecimento. Atravessamos a vida na periferia da ignorância, trespassando em cada aurora o universo do incompreensível, com a insignificância do que vivendo compreendemos no seu momento. Na verdade a incompreensão que nos domina é completamente compreensível. Desde logo porque a nossa construção foi planeada por arquitectos da “roda” num momento em que o homem já tinha pisado a lua. Começam nas escolas por nos incutir valores de uma sociedade que não existe. Formam-nos nas universidades para ciências que não existirão no futuro. Vendem-nos valores de respeito pelo igual, pelo aceitável, e não nos ensinam a disciplina da convivência com o diferente. Devíamos ser formatados como agentes da mudança mas pintam-nos com as cores da perpetuação do existente. Ensinam-nos e esquecem sempre que nos devem educar. Entramos com a vista turva, tementes do incerto para este processo em que nos formatam a uma realidade. Quando saímos somos completamente invisuais para a realidade que encontramos. Somos o produto de uma educação, que se tivesse a oportunidade, ensinaria um esquimó a viver do consumo de carne de vaca. Como seria ideal que nos levassem a desenvolver a nossa intuição, a potenciar a nossa unicidade, ela sim, capaz de ser alavanca da mudança. Como seria ideal que nos incutissem, não simplesmente a aceitação do estado das coisas, mas a por em questão tudo o que existe em função da sua efemeridade. Como seria uma sociedade que forma pessoas não para perguntar “que horas são” mas para questionar “que raio é o tempo”? Somos meros robots programados por uma ideia quando ao mesmo tempo a sociedade se transformou e exige outra.
"Dêem-nos o supérfluo da vida, e dispensaremos o necessário”, alguém o disse e não foi eu. E basta sair para a rua para estar rodeado das mais banais manifestações deste desconhecimento compreensível. Ideais “pret-a-porter”, procura do normalizado, ambição do superficial. A luta sangrenta pelo “ter” pelo “ser” mesmo que à custa da total aniquilação do “sentir”. A veneração do efémero em ignorante detrimento do eterno.
Quero continuar a acreditar, que esta realidade é consequência de uma ilusão imposta, vendida ou ensinada. E que todos os seus actores regressão a casa depois da sua brilhante interpretação desejando uma realidade diferente, ou simplesmente – acrescentaria eu -, uma realidade. Manipulando com liberdade a frase “Dêem-nos o supérfluo da vida, e dispensaremos o necessário” eu diria “ Formem-nos com a consciência do necessário e dispensaremos o supérfluo”.

III – A inversão da pirâmide

Mas como tentar dominar a constante mutação do real, e dessa forma aumentar o perímetro da fantástica ignorância? Como? Não sei! Vivo com isso apesar disso e por isso. Tomei consciência e aceitei que nada do que somos seremos! E nada do que fomos continuamos a ser. Somos hoje consequência do ontem vivido, seremos amanhã o reflexo do hoje construído. Um misto de realismo e alquimia, de sonho e realização, de romantismo e pragmatismo, de luta e submissão, de rebeldia e conformismo, de certeza e experimentação, de displicência e reflexão, de dúvida e compreensão. Somos e seremos! Do tudo que é nosso um pouco, do muito que é de outrem outro tanto.
A minha única convicção é saber que jamais saberei, que todas as minhas dúvidas se perpetuarão mesmo que num determinado momento me pareça o contrário. Compreendo a minha passageira condição neste mundo, e somente me dedico ao deleite da surpresa com todos os seus mistérios. Deixei de tentar compreender o incompreensível e simplesmente sinto. Não desejo um futuro de saudades do não vivido, enquanto tento compreender as razões de o não ter feito. Não desejo porque não tendo uma métrica para a saudade desvalorizaria o seu tamanho, qualquer que ele fosse. Alimento cada dia a capacidade de sentir o encanto da imprevisibilidade de um palco em transformação. Vivo esfomeado pelo sentir e aceito as consequências dessa fome. Nesta vida muito ganhei e outro tanto perdi, em proporção igual ou diferente que interessa! Perder e ganhar será sempre uma consequência! Sejamos parte activa ou meros espectadores. No primeiro caso perderemos por arriscar ganhar, no segundo por nada ter a perder. Sempre perderá mais, quem aumenta dúvida à ignorância pela vivência da realidade. A ignorância não é mensurável “ad-eternum “, diminui para quem só existe, aumenta inevitavelmente, para quem arrisca viver. A dúvida é compreensível e justificável. Muito existe na vida que não necessita de qualquer explicação, simplesmente é assim. Somos mentes temporárias que exploram um universo eterno. Uma luta tão desigual quanto fantástica. É exactamente na nossa temporalidade que reside a nossa beleza. O que é eterno nada valoriza, porque é isso mesmo, eterno! Para os mortais tudo embora temporário, pode durar uma eternidade numa consciência com lembranças. É na experimentação activa da constante transformação, que ficamos com esses quadros estáticos que imortalizaram um momento, aos quais chamamos de memórias.
Memórias!
Sorrisos que damos à vida quando esta não sorri para nós.
Memórias!
A nossa vitória sobre o tempo, a bandeira de eternidade na colina do efémero. Tudo o que fica quando tudo resto passa. Por elas vivemos por elas experimentamos, lutamos, sonhamos e erramos.
Memórias! A vitória da ignorância humilde sobre a mutação.
E se hoje for um desses dias em alguém acha que tudo acabou, que o tempo já enferrujou o que antes era um sorriso fácil, saia para rua! A vida fala, sussurra, anuncia e realiza. Tantas vezes este processo é alheio à nossa realidade, não porque não exista! Porque existe e sempre existirá! Mas porque na ânsia dos dias ou das horas não observamos os segundos. Na surdez imposta pelos barulhos dos nossos medos, perdemos a capacidade de escutar a sua voz.
Saia para a rua! Perca-se, seja ignorante e escute os sons da natureza. Valorize as horas alimente-se dos segundos. Alguém disse, ”temos direito na vida a um erro grave, a um vício inofensivo e a um amor verdadeiro”…. Seja os três, “Contemple os dias passados mas tenha os olhos voltados para a eternidade”. Decida aceitar que devemos viver pelo que nos mata e morrer pelo que nos faz estar vivos.
Não! Não sou um lunático que ou entrou no limiar do desespero, nem me rendi aquelas substâncias que o organismo não expele de forma natural. Não tive mais remédio que aceitar a inversão da pirâmide dos valores da minha existência. O que nos mata é exactamente o mesmo que nos dá vida. O tempo! A vida é em si mesma um hábito que mata. E é na forma como com ele lidamos que reside um dos segredos da felicidade abraçada ao incompreensível. Vivamos sem pensar nele, mas com ele e para ele. Sejam quais forem as circunstancias sempre teremos o poder de mudar o nosso tempo e a forma como as estações se vão apresentado aos olhos da nossa insignificância. Nada fica sempre igual e nada existe realmente. Aparência e vazio existem simultaneamente. Viver é a única maneira que conheço para poder sonhar. E sonhar a única forma que conheço de me sentir vivo.
Que seja eterno tudo o que de temporal em mim existe.
Que eu atinja a eternidade por tudo aquilo que em mim não é visível.
Enquanto vivos tudo é despedida e por isso agora me despeço com todos os sonhos do mundo que faço meus, e com este sorriso que é vosso.
Que me faz sair agora? Neste dia de sol onde agarro a vida com a força dos sonhos.
Que me faz sair agora? Nesta noite, onde a ultima lágrima secou pelo calor de todos os meus sorrisos?
Que me faz sair agora?
A certeza de que só lá fora morrerei experimentando a vida, e só com esta poderei alterar o rumo do efémero vencendo o que me mata.

11-05-2010


Popular Posts